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Foco na atenção básica à saúde do Rio e nas organizações sociais [1]

O Centro de Estudos da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca promoveu debate sobre tema polêmico: o modelo de gestão da Saúde pautado nas organizações sociais. Para o subsecretário do Rio, as OSS trouxeram avanços à atenção básica. Muitos contratos desse modelo de gestão, porém, anunciou o vereador Paulo Pinheiro, deverão ser encerrados em virtude do alto número de irregularidades.

A gestão da atenção básica à saúde no Rio de Janeiro pautou o debate realizado pelo Centro de Estudos da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz), no Rio de Janeiro, no dia 31 de julho. O evento reuniu pesquisadores, alunos e profissionais de saúde no auditório térreo da Ensp e trouxe como palestrantes o vereador do Rio, Paulo Pinheiro (Psol), o subsecretário de Atenção Primária, Vigilância e Promoção da Saúde da Secretaria Municipal de Saúde do Rio, Daniel Soranz, o pesquisador da Ensp Nilson do Rosário Costa e a pesquisadora do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Maria de Fátima Siliansky de Andreazzi.
 
Primeiro palestrante da mesa, Soranz comparou as duas últimas gestões da Saúde do Rio. “Até 2008, éramos uma das cidades com maior gasto per capita em saúde do país e com os piores indicadores. Detínhamos o menor financiamento público municipal entres as capitais e, além disso, 83% do nosso orçamento em saúde eram em gastos com hospitais”, lembrou. Segundo ele, na gestão municipal anterior a de Eduardo Paes, prefeito do Rio desde 2009, houve crescimento de 52,8% dos planos privados de saúde em detrimento do público, passando de 2.459.561 beneficiários, em 2000, para 3.371.459, em 2009.
 
Soranz destacou a Reforma nos Cuidados em Atenção Primária (RCSP), iniciativa lançada em 2009 pela Secretaria Municipal de Saúde e Defesa Civil, dando à atenção básica o papel de ordenadora das redes de atenção. “Essa reforma foi dividida em três componentes: organizacional, administrativo e modelo de atenção”, descreveu o subsecretário, focalizando em seguida o segundo componente.
 
No que se referiu à reforma a administrativa, Soranz informou que foi preciso enfrentar problemas de execução orçamentária, tempo médio dos processos e de remanejamento, transparência dos contratos e fortalecimento do SUS. Tomando como referências tais desafios, a gestão municipal optou pelas organizações sociais de saúde (OSS), na modalidade de convênio. De acordo com o subsecretário, muitos processos evoluíram em virtude do modelo de gestão baseado nas OSS, possibilitando, por exemplo, estabelecer uma meta de 70% de cobertura da Estratégia Saúde da Família, base da atenção básica à saúde, até 2016. “O Rio buscou, a exemplo de outros municípios brasileiros, o modelo das OSS como alternativa de flexibilidade e agilidade gerencial, autonomia financeira e administrativa, voltadas para os resultados e para a sua clientela, com o intuito de racionalizar a utilização dos recursos e incrementar a prática de prestação de contas, associando responsabilidade na alocação de recursos ao desempenho e aos resultados sociais. Isso sem dispensar os mecanismos do aparato estatal de controle e auditoria, como órgãos de Controladoria-Geral e Tribunal de Contas do Município”, finalizou o subsecretário, contrariando grande parte do público presente.
 
Soranz foi seguido pela apresentação de Paulo Pinheiro, um crítico acirrado desse modelo de gestão da Saúde implantado no Rio de Janeiro. O vereador iniciou sua fala questionando a adesão a uma nova gestão baseada nas OSS em detrimento da administração direta da Saúde. Segundo ele, muitos contratos da atual gestão municipal estão sendo fiscalizados e podem ser encerrados em virtude do alto número de irregularidades. Pinheiro lembrou a Lei n° 5.026, de 19 de maio de 2009, conhecida como Lei das OSS, que dispõe sobre a qualificação de entidades como organizações sociais, e salientou as formas de execução e fiscalização dos contratos de gestão.
 
Em alusão aos dados apresentados por Daniel Soranz, Pinheiro questionou os números, apontando problemas graves na atenção básica do Rio, como demora na marcação de médicos e exames, alta rotatividade de profissionais médicos, entre outros aspectos que culminam na insatisfação da população com a Saúde no município. “Diante de tantos problemas, por que não a administração direta?”, indagou.
 
Ao fim de sua apresentação, o vereador citou as análises do Tribunal de Contas do Município do Rio de Janeiro (TCM) sobre o desempenho das OSS e questionou a criação da Empresa Pública de Saúde do Rio de Janeiro, a RioSaúde. “Essa empresa passa a ter responsabilidade sobre a gestão de todas as unidades básicas de saúde do Rio de Janeiro. O que nos resta saber é exatamente como pretende atuar a RioSaúde”, perguntou.
 
Coube ao pesquisador Nilson do Rosário, do Departamento de Ciências Sociais da Ensp/Fiocruz, avaliar o papel das OSS no Rio de Janeiro. Para ele, a falta de coerência entre o que defende e o que implementa é, hoje, a maior crítica que se tem ao sistema de saúde. O professor apontou, ainda, a dificuldade de se avaliar os contratos fechados com base no formato de gestão por OSS e lembrou que São Paulo também passou por uma reforma e, atualmente, tem uma atenção básica favorável. “Necessitamos de mais clareza nas questões políticas. O Rio de Janeiro é uma cidade dividida, que tenta ser global. O nosso desafio é incluí-la nessa globalidade”, disse.
 
Encerrando o debate, a pesquisadora Maria de Fátima Siliansky de Andreazzi, do Instituto de Saúde Coletiva da UFRJ, falou sobre a lógica da terceirização da gestão. Segundo ela, ao contrário do que vem sendo propagado, o modelo de terceirização de contratos, a exemplo das OSS, não é recente e é adotado em outros países. A professora lembrou que este modelo implica definir compromissos e metas. No entanto, ressalvou, “quantidade de serviços não significa necessariamente efetividade do sistema de saúde”. 
 
A pesquisadora citou ainda a fragilidade do controle social da Saúde do município. “Esse é o grande problema, pois se trata de uma sociedade militarizada, onde o sentimento de medo perante o Estado impera”, observou. 
 
Por Flavia Lima, da Secretaria de Comunicação da RET-SUS 

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