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01/01/2005 Versão para impressãoEnviar por email

Educação Profissional na África

“Chegamos à conclusão de que,sem a formação qualitativa dos profissionais, nenhuma mudança seria suficiente para melhorar o quadro sanitário do país”. Essa frase poderia ter sido dita por alguém que quisesse explicar, por exemplo, a criação da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES), no início do governo Lula. Mas o autor da frase é Davi Domingos Luiz, diretor da Escola Técnica Profissional de Saúde da Província de Lubango, em Angola, referindo-se à reformulação do ensino em saúde do país.

Angola veio parar na Revista RET-SUS porque a Fundação Oswaldo Cruz participa de um Programa de Apoio à Capacitação de Recursos Humanos em Saúde nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa e, recentemente, a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV) vem inserindo a educação profissional como pauta desse intercâmbio. “Como centro colaborador da Organização Mundial de Saúde, uma das nossas funções é incorporar outras instituições com potencial de cooperação na formação de técnicos em saúde para que as relações do Brasil com outros países se fortaleça nessa área. E isso, naturalmente, diz respeito principalmente às ETSUS”, explica Marise Ramos, coordenadora de cooperação internacional da EPSJV. Além disso, essa coordenação trabalha também no projeto de criação de uma rede sulamericana e mesmo uma rede internacional de escolas técnicas, tendo como referência o conhecimento e a experiência da RET-SUS.

De 25 de outubro a 7 de novembro, Albertina Mattos, professora-pesquisadora da EPSJV, José Inácio Motta, da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) e Luiz Eduardo Fonseca, da Assessoria de Cooperação Internacional da Fiocruz foram a Luanda, em Angola, dar um curso de atualização e desenvolvimento pedagógico na área de gestão de saúde. Albertina aproveitou esse momento para conhecer melhor a realidade do ensino técnico no país e fortalecer contatos. Para isso, fez entrevistas com quatro representantes de Escolas Técnicas locais, que serviram de fonte para esta matéria.

Ensino em transformação

A partir da primeira entrevista,realizada com Lino Silili e Henriqueta Tavares, diretores da Escola Técnica profissional de Luanda, surgiu uma primeira demanda, que a EPSJV buscará atender, relacionada à organização e estruturação de currículos a partir das orientações da Reforma de Ensino que vem se desenvolvendo em Angola.

Na Saúde, dois grandes componentes da reforma do ensino são, segundo Davi, autor da frase lá de cima,a fusão entre as escolas técnicas profissionais e os institutos médios e a regionalização. Antes, as escolas técnicas eram responsáveis pelos cursos de nível básico, que formavam auxiliares, e os institutos ofereciam os cursos técnicos de nível médio. Da fusão entre esses dois tipos de instituições, nasceram as escolas técnicas profissionais. “Esses institutos davam um componente do ensino geral e um componente profissionalizante, mas constatou-se que a preparação dos egressos não era suficiente. Eles apresentavam fracas condições técnicas, já que se interessavam mais pela questão acadêmica para depois continuarem os cursos nas universidades”, explicou Davi. O resultado, segundo ele, é que iam trabalhar no sistema de saúde apenas aqueles que não conseguiam entrar na universidade. Agora,eles ingressam no curso mais tarde e levam menos tempo para concluí-lo.

A partir dessa fala, Marise Ramos destaca a necessidade de a cooperação internacional ir além da resolução de demandas pontuais e ter uma participação mais profunda na concepção político-pedagógica. Ela lembra que a experiência brasileira pode contribuir para a reflexão sobre algumas crenças, como essa, de que a articulação entre uma formação geral e o ensino profissionalizante resulta numa má formação técnica. “No Brasil, isso gerou o decreto 2208, que separava o ensino médio do técnico e teve conseqüências desastrosas. Ele foi revogado e, recentemente, substituído pelo decreto 5154, que incentiva a formação integrada. Defendemos que a educação é um direito e, portanto, a busca pela ampliação de escolaridade é legítima e não atrapalha o conhecimento técnico, ao contrário”, diz.

O segundo ponto principal da reforma é a redistribuição geográfica das instituições. Ao todo, Angola tinha 18 escolas, pelo menos uma em cada província. Agora, eles estão identificando as reais necessidades de cada região e prevendo a reestruturação de cinco segundo o novo modelo. “As províncias que não forem contempladas com a fusão continuarão comas antigas escolas técnicas como centros de treinamento e educação permanente”, explicou Davi.

Segundo Abel Sunda, coordenador do curso de farmácia da Escola Técnica de Saúde de Luanda, a prioridade da reforma agora é a formação deformadores. “Só assim vamos chegar a um novo sistema, com resultados mais próximos dos desejados. Esperamos ter técnicos mais preparados para o manejo de equipamentos e para atender a população”, explica.

Agora em fevereiro, os pesquisadores José Paulo Vicente, da EPSJV, e Cristina Figueiredo, da ENSP, foram a Moçambique desenvolver um curso semelhante ao que já foi dado em Angola.É o trabalho que recomeça.

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