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escola em foco
ESP-MG focaliza a supervisão clínica e institucional em saúde mental

Escola promove a reflexão sobre os elementos que envolvem o trabalho de supervisão em saúde mental.

Jéssica Santos

Não é de hoje que o tema da Saúde Mental aparece nos processos formativos ofertados pelas instituições de ensino da Rede de Escolas Técnicas do SUS (RET-SUS). Exemplo exitoso nesse sentido, a Escola de Saúde Pública de Minas Gerais (ESP-MG) realizou, entre os meses de junho e novembro de 2013, os Encontros ESP-MG 2013 – Supervisão clínica e institucional em saúde mental, reunindo cerca de 500 participantes, entre gestores municipais, representantes de centros de apoio psicossociais (Caps) e profissionais da Saúde Mental, de 70 cidades mineiras. O objetivo foi apresentar o amplo espectro de elementos que envolvem o trabalho de supervisão em saúde mental, provocando reflexões capazes de transformar a prática. “Como espaço democrático de discussão e construção de conhecimento, a ESP-MG realizou palestras com referências nacionais na área da Saúde Mental”, revelou Damião Mendonça, ex-diretor da escola — em 19 de fevereiro de 2014, ele passou o cargo ao engenheiro e especialista em Gestão de Políticas Públicas, Rubensmidt Ramos Riani.
Na avaliação do ex-vice-diretor da ESP-MG e coordenador do projeto, Augusto Nunes, a série de encontros — ao todo, cinco — contribuiu para a produção e sistematização do conhecimento em saúde pública. “A supervisão clínica, incorporada ao longo do tempo no campo da Saúde Mental, é considerada um tema complexo devido as suas especificidades”, justificou. Ele contou que o encontro foi bastante proveitoso. “A participação se deu por meio de perguntas, relatos e troca de experiências, tendo o reconhecimento da importância e consistência do aporte teórico apresentado pelos palestrantes”, afirmou.
As atividades foram organizadas de modo a contemplar as ideias de responsabilidade compartilhada da equipe e de diálogo para que as diferentes questões possam ser expostas e os casos e as situações em saúde mental sejam tratados sob a perspectiva da atenção psicossocial. A supervisão atua de forma a sustentar a proposta de uma gestão partilhada da clínica, que auxilie os profissionais a enfrentarem os impasses institucionais frequentes no cotidiano do trabalho coletivo. Segundo a Política Nacional de Saúde Mental, a supervisão clínica deve levar em conta a integração da equipe de cuidado para possibilitar a construção de projetos terapêuticos que articulem os conceitos de sujeito, rede, território e autonomia. “Minas Gerais é um estado com quase 600 mil km² e 20 milhões de habitantes distribuídos em 853 municípios. Em vários desses municípios, existem serviços de saúde mental que, muitas vezes, demandam supervisão como forma de melhorar a qualidade da assistência por eles prestada”, informou Nunes. Ele contou que a supervisão é demandada pelos profissionais e serviços para intervir em problemas clínicos, institucionais, sociais, culturais, econômicos e políticos.

Reconhecimento

De acordo com o secretário estadual de Saúde, Antônio Jorge de Souza Marques, a rede de saúde mental de Minas Gerais é reconhecida pelo Ministério da Saúde, o que faz dessa experiência da ESP-MG ainda mais relevante. “Como consequência disso, precisamos redobrar nossos esforços daqui para frente”, recomendoue. Francisco Barreto, ex-preceptor da residência da psiquiatria do Instituto Raul Soares e analista da Escola Brasileira de Psicanálise, durante o quinto e último encontro, realizado em outubro de 2013, lembrou que a internação, até a Reforma Psiquiátrica brasileira — consolidada pela Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001 —  era a única opção de tratamento. Ele defendeu pensar o conceito de saúde mental para além dos sintomas. “A saúde mental é definida pelo Código Internacional de Doenças como ausência de transtornos mentais. Precisamos, porém, focalizar outros conceitos, entendendo a saúde mental como estado de bem-estar”, orientou.
“Os encontros serviram de espaço para discutir novas fronteiras e formas de pensar a saúde mental, que não segrega e enxerga o doente como sujeito de direitos”, destacou a psiquiatra, professora da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), doutora em Epidemiologia e coordenadora do Laboratório Interdisciplinar de Pesquisa em Atenção Primária em Saúde, Sandra Fortes. Ela e o psiquiatra Renato Diniz, doutor em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), preceptor do Instituto Raul Soares e professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), fizeram parte do quarto encontro da ESP-MG, no qual trataram dos temas da clínica nos equipamentos secundários e do matriciamento e supervisão clínica-institucional na atenção básica.
No terceiro encontro da série, realizado em agosto de 2013, o professor da Universidade de São Paulo (USP) Francisco Baptista Assumpção e o vice-presidente da Associação Brasileira de Neurologia e Psiquiatria Infantil (ABENEPI), José Belizário Filho, apresentaram, respectivamente, as palestras Conceito, clínica e instituição e Prevenção, cuidado e inclusão.  Assumpção abordou as relações entre a história da humanidade e a saúde mental. “Nossa espécie tem dois milhões de anos, a ética tem 2.500, a psiquiatria, 300 a 400 anos e os direitos dos doentes mentais, apenas 50 anos”, calculou. Para ele, é fundamental pensar este campo, cujos direitos inerentes a ele são ainda muito recentes, sob a ótica da Reforma Psiquiátrica. “Minha busca é plantar uma semente que frutifique. Há um descaso grande em relação à saúde mental na infância e na adolescência”, destacou. O mesmo observou Belizário Filho, para quem o cuidado à saúde mental de crianças e adolescentes está ainda em segundo plano. “Por muito tempo, as pessoas se preocuparam em dar comida às crianças. Temos agora outro desafio: cuidar da saúde mental delas”, sugeriu.
O segundo encontro, realizado em julho de 2013, sob o tema Supervisão em álcool e drogas, contou com a participação do professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Frederico Garcia. Ele tratou dos modelos clínicos na área, destacando a importância da troca de experiências no fortalecimento da Rede de Saúde Mental de Minas Gerais. “Precisamos traçar estratégias comuns e construir uma rede de troca”, disse.
Pesquisadora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Clarice Madruga tratou do tema do desenvolvimento dos transtornos e demandas de tratamento.  Segundo ela, com base nos dados do Segundo Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (Lenad), realizado pela Unifesp entre os anos 2006 e 2012, cerca de 1,5 milhão de adolescentes e adultos usam maconha diariamente no Brasil. Ainda de acordo com a pesquisa, mais de três milhões de adultos, com idade entre 18 e 59 anos, fumaram maconha em 2012 e cerca de oito milhões de adultos (7%) já experimentaram a droga alguma vez. Entre os usuários, o levantamento aponta três vezes mais homens. Do total, 62% tiveram o primeiro contato com a maconha antes dos 18 anos. Entre os adolescentes de 14 a 18 anos, 470 mil revelaram que fizeram uso em 2012 e 600 mil disseram já ter experimentado a droga alguma vez na vida. Além disso, 17% dos consumidores nessa faixa afirmaram que conseguiram a substância dentro da escola. “A gente que trabalha com pesquisa tem que apresentar esses dados aos profissionais que estão cuidando das pessoas. Não adianta fazer ciência no laboratório e não dividir com quem está atuando na ponta”, observou.
Realizado em junho de 2013, o primeiro encontro abordou o tema Supervisão em saúde mental: conceito, história e assistência e contou com a participação dos médicos Pedro Gabriel Delgado, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador nacional de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas do Ministério da Saúde (entre 2000 e 2010), e Jackson Sampaio, reitor da Universidade Federal do Ceará.  Vale citar que todos os temas dos cinco encontros farão parte de uma publicação da ESP-MG, sob o título Supervisão em Saúde Mental.

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