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Saúde, Educação e Trabalho pelo SUS

Evento destaca-se pelo encontro de atores diversos em torno do tema da educação permanente e da formação dos profissionais para o sistema de saúde brasileiro.

Ana Paula Evangelista e Flavia Lima

A pluralidade das práticas de saúde e a integração entre os campos da Educação, da Saúde e do Trabalho estiveram expressas nos fóruns de debate, távolas, oficinas, seminários, rodas de conversa e relatos de experiências do 11º Congresso Internacional da Rede Unida, realizado em Fortaleza (CE), entre 10 e 13 de abril. Sob o tema Girar vida, políticas e existências: a delicadeza da educação e do trabalho no cotidiano do SUS, o evento reuniu mais de seis mil pessoas, entre congressistas, convidados internacionais e conferencistas brasileiros, destacando-se, como de tradição, pelo debate em torno da educação permanente e da formação dos profissionais como dispositivos de mudança da gestão e da organização do SUS. “Além dos congressistas brasileiros, tivemos a participação de 16 países da América Latina, Caribe, EUA, Canadá, Europa e África e recebemos em torno de 60 convidados internacionais com contribuições acerca da saúde, da educação, da gestão e do trabalho em saúde, ampliando ainda mais o espaço de debate”, ressaltou Alcindo Ferla, coordenador nacional da Associação Brasileira da Rede Unida, que, neste ano, completa 30 anos de atuação em prol da formação profissional e do fortalecimento da Política de Educação Permanente da Saúde.

Na abertura do evento, precedida pelo grupo Ação Cultural para a Liberdade, que promoveu uma ciranda festiva, e pelo cantor João do Crato e sua banda, animando os convidados com um repertório regional que lembrou a obra de Luiz Gonzaga, o ministro da Saúde, Arthur Chioro, frisou a importância que as estratégias de educação permanente têm para alavancar ainda mais o SUS e lembrou a pertinência do Programa Mais Médicos para a Atenção Básica à Saúde. “Já temos, em todo o Brasil, 14 mil médicos e 49 milhões de brasileiros atendidos. Aqui no Ceará, somente, são 842 profissionais atuando em 172 municípios. Mas, o que precisamos, de fato, é idealizar uma política de investimento integrado”, orientou. Além de levar mais profissionais onde há escassez e ausência deles, o Mais Médicos, ao buscar o aprimoramento da formação, provocou uma reflexão sobre a atuação profissional.

Em alusão a um dos principais desafios de sua gestão, Chioro frisou ser preciso repensar o modelo de cuidado e o SUS como projeto político, ético e em defesa da vida. “Para isso, é preciso mudar o jeito de cuidar e territorializar o sistema de saúde e pensar uma estratégia de formação diferenciada, além de garantir a formação permanente sob responsabilidade das três esferas de governo”, recomendou, sendo, em seguida, interrompido por um grupo de residentes trazendo palavras de ordem e cartazes contra a precarização do SUS e a favor das residências multiprofissionais. Por reconhecer a pertinência da manifestação, Chioro cedeu o espaço ao grupo, revelando que o governo federal tem buscado reduzir os desgastes relacionados aos temas. “Vamos inovar e criar residências multiprofissionais. Queremos um debate democrático”, garantiu, sob aplausos efusivos.

Pertinência do agente de saúde

As questões inerentes aos agentes comunitários de saúde mereceram destaque no que se referiu ao debate da formação profissional para o SUS. A oficina Dialogando sobre os desafios do trabalho, da formação profissional e da organização política do agente comunitário de saúde no SUS, organizada pelo Laboratório de Educação Profissional em Atenção à Saúde da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio da Fundação Oswaldo Cruz (Laborat/EPSJV/Fiocruz), condutor do curso Técnico em Agente Comunitário de Saúde no Rio de Janeiro, buscou identificar os nós críticos referentes à formação deste profissional e construir uma agenda positiva para enfrentar o problema da institucionalização do trabalho.

Aldiney Doreto, coordenador-geral de Ações Técnicas em Educação na Saúde, do Departamento de Gestão da Educação na Saúde da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde (Deges/Sgtes/MS), bem como da Rede de Escolas Técnicas do SUS (RET-SUS), lembrou que o tema é foco de todas as 40 escolas técnicas do SUS que, hoje, integram esta Rede. “Tentamos, ao máximo, garantir que a qualificação da categoria se dê da forma mais completa e menos fragmentada, mas os desafios na gestão da saúde são inúmeros”, reconheceu.

Ele defendeu experiências exitosas de formação completa do agente comunitário de saúde, a exemplo da oferta feita pela EPSJV. “Quase todo grupo de trabalhadores dessa categoria já foi formado na primeira etapa e alguns já fizeram a segunda e a terceira etapas, mostrando que é possível alcançarmos o ideal”, observou. Em setembro, a EPSJV deverá concluir mais uma turma da formação, iniciada em abril de 2013. O grupo é formado por 31 alunos que atuam como agentes comunitários nos municípios do Rio e de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, e que já haviam feito a primeira etapa da formação na Escola Técnica em Saúde Enfermeira Izabel dos Santos (Etis). Além da EPSJV, vale citar a Escola Técnica em Saúde Maria Moreira da Rocha, no Acre, que já formou 1.600 profissionais técnicos em agentes comunitários de saúde. O curso técnico, com 1.320 horas de aula, foi ofertado em vários municípios do estado, incluindo os de difícil acesso, entendendo que a formação fortalece ainda mais a categoria.

As experiências seguem o Referencial Curricular para o Curso Técnico em Agente Comunitário de Saúde, publicado pelos ministérios da Educação e da Saúde em 2004. O documento orienta que a formação se faça em três etapas, perfazendo uma carga horária mínima de 1.200 horas, conforme Resolução CNE/CEB nº 04/09. O curso está estruturado em percursos formativos, organizados de forma interdependentes, possibilitando progressão concomitante à escolarização do trabalhador. “Após uma década da publicação, o curso técnico não é uma realidade em todo o país”, lamentou a pesquisadora do Laborat, Márcia Lopes. Segundo o laboratório, há 250 mil agentes comunitários de saúde no país, e a maioria realizou, no máximo, a primeira etapa da formação. “Dos cerca de 600 agentes comunitários do município de Caxias, na Baixada Fluminense do Rio, apenas 10% fizeram a primeira etapa do curso”, garantiu a agente comunitária de Saúde, Eunicéa Lima, aluna do curso ofertado pela EPSJV.

Ela também citou o problema do baixo salário, que, hoje, em grande parte do país, é inferior a um salário mínimo — vale citar que, no dia 17 de junho, a presidenta Dilma Rousseff sancionou o Projeto de Lei do Senado (PLS) 270/2006, criando a Lei nº 12.994/14, garantindo o repasse de R$ 1.014,00 aos municípios pelo governo federal para o pagamento dos agentes comunitários de saúde e agentes de endemias. Conhecida como Piso Salarial Nacional dos Agentes de Saúde, a nova Lei representa a conquista de uma reivindicação histórica da categoria, que não tinha um valor garantido em âmbito nacional (ver matéria sobre o assunto no site da RET-SUS, em www.retsus.fiocruz.br).

Parte da história do SUS

Os palestrantes aproveitaram para fazer um resgate histórico da inserção dos agentes comunitários de saúde no SUS, recordando os primeiros profissionais que surgiram em várias comunidades na década de 1970. De acordo com Márcia, esses profissionais ganharam visibilidade em 1990, com o Programa Nacional de Agente Comunitário de Saúde (PNACS). Em 1992, a proposta recebe o nome Programa de Agente Comunitário de Saúde (Pacs) e, em 1994, destaca-se com a construção do Programa Saúde da Família (PSF). “São duas décadas de estruturação dessa categoria”, lembrou.

Segundo a pesquisadora, no documento Política de Atenção Básica, publicado em 2006, o PSF — hoje chamado Estratégia Saúde da Família (ESF) — foi citado como ação prioritária para a reorganização da Atenção Básica no Brasil, substituindo o modelo tradicional de assistência voltado para a cura de doenças e focalizando a promoção e a prevenção da saúde. “Por isso, tanto o Pacs quanto a ESF têm em comum a figura do agente comunitário de saúde como elemento primordial no quadro funcional, sobre o qual recaem expectativas de mediação e facilitação do trabalho de atenção básica à saúde, reforçando a importância em aprofundar a discussão da formação e a luta da qualificação e do reconhecimento desse profissional”, frisou.

Ao fim da mesa, foi proposta a construção de uma agenda de debate sobre o tema, a ser conduzida pelo Laborat, a partir dos eixos Formação e Trabalho, para tratar de vínculo trabalhista, plano de cargos e salários e processo de trabalho, tendo como ponto de partida as políticas de saúde inerentes ao agente comunitário de saúde. Foi também proposto buscar a aproximação com o Conselho de Secretarias Municipais de Saúde, movimentos sociais e escolas.

Escolas presentes

O congresso da Rede Unida contou com a participação de vários integrantes da RET-SUS. A Escola de Formação Técnica em Saúde Prof. Jorge Novis (EFTS), na Bahia, apresentou quatro trabalhos elaborados por docentes da instituição e parceiros da Universidade Federal da Bahia (UFBA). O relato Sensibilização de gestores municipais para a implantação de cursos técnicos em saúde, apresentado por apoiadores da EFTS, revelou como a escola conseguiu sensibilizar os secretários municipais de saúde quanto à importância da formação de trabalhadores para SUS, face às eleições municipais de 2012 que poderiam provocar, na ocasião, mudanças na gestão.

O trabalho foi iniciado pelas reuniões das Comissões Intergestoras Regionais (CIRs), onde os apoiadores apresentaram os cursos da escola voltados para as áreas de Atenção Primária em Saúde e Rede Hospitalar. Em seguida, os profissionais da EFTS promoveram reuniões com secretários municipais, com o objetivo de pactuar a implantação dos cursos. A enfermeira e apoiadora dos cursos descentralizados da EFTS, Luciana Reis Pimentel, recordou que o trabalho resultou no interesse de 16 municípios, envolvendo, ao fim, sete gestores comprometidos com a formação de seus trabalhadores. “Eles assinaram um termo de compromisso, estabelecendo as obrigações da EFTS e do município no desenvolvimento do curso”, contou. A perspectiva, com a iniciativa, é formar nas áreas 1.067 trabalhadores até o fim de 2014, abarcando a macrorregião Sul da Bahia.

O trabalho de sensibilização não se encerra, porém, na assinatura do documento, explicou Luciana. “O apoiador deve ser um problematizador de atividades educativas, compartilhando com os coordenadores regionais e locais, docentes, discentes e comunidade elementos da realidade vivenciada, levantando hipóteses de solução para os problemas encontrados, revendo os processos, refletindo a teoria e experimentando novas estratégias para enfrentar os desafios dos processos formativos”, disse. Além de Luciana, o trabalho contou com a participação de Cláudia Lemos Vieira Lima, Giselle Alves da Silva Teixeira, Silvana Lima Vieira e Gilberto Tadeu Reis da Silva.

Formação pedagógica das docentes dos cursos da EFTS, Projeto de intervenção: proposta inovadora de avaliação do curso Técnico em Enfermagem da EFTS no Alto das Pombas e Calabar, em Salvador (BA) e Formação dos técnicos em enfermagem: uma ação do Pacto pela Vida no Alto das Pombas e Calabar em Salvador (BA) foram os títulos dados aos três outros relatos de experiência da escola da Bahia. “É uma oportunidade de promover a articulação dos serviços de saúde com as instituições formadoras, contribuindo ainda mais para a formação dos trabalhadores de saúde”, resumiu Joelma Pinheiro Meira Barbosa, gerente de Projetos e Pesquisa da EFTS. Segundo ela, os trabalhos buscaram incentivar e consolidar mudanças pedagógicas na instituição, aumentando a autoestima de docentes e discentes e incentivando a investigação voltada para o enfrentamento de situações adversas, tomadas de decisões e solução de problemas oriundos dos processos de trabalho. 

A Superintendência de Pesquisa da Escola de Saúde Pública do Estado de Minas (ESP-MG), representada pelas superintendente, Marilene Barros de Melo, e pesquisadora Luciana Souza d’Ávila, trouxe para o Congresso da Rede Unida doze trabalhos.  Dentre eles, A implementação do curso Técnico em Hemoterapia no âmbito de uma escola de Saúde Pública do Sistema SUS: a construção do conteúdo programático sob a perspectiva interdisciplinar focalizou a formação técnica, ofertada pela escola entre 2012 e 2013, identificando os desafios e as especificidades do programa curricular. “Esse trabalho faz parte de uma grande pesquisa sobre a análise das ações educativas ofertadas pela ESP-MG”, informou Marilene.

O trabalho da ESP-MG buscou analisar o curso Técnico em Hemoterapia no seu momento inicial, intermediário e final, bem como identificar, compreender e analisar as percepções dos diversos sujeitos envolvidos — superintendente de Educação, discentes, docentes e referências técnicas — quanto à realidade do processo educacional. “A pesquisa poderá nortear a escola quanto aos desafios para a formulação e implementação do curso, além de desvendar o campo da prática transfusional no Brasil, ainda pouco explorado”, observou Marilene.

A Superintendência de Educação da ESP-MG, por meio de seu Núcleo de Atenção Primária e Vigilância em Saúde, apresentou outros dois títulos em rodas de conversa — Fortalecendo o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Nasf) em Minas Gerais: uma experiência de formação de referências técnicas do estado em parceria com a ESP-MG e Formação de professores universitários: contribuições da ESP-MG ao Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde   (Pró-Saúde) —, desenvolvidos em parceria com Cássia Beatriz Batista, docente da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG).  O primeiro trabalho teve como objetivo ampliar o conhecimento dos profissionais dos núcleos de Atenção Primária à Saúde da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG), permitindo uma atuação mais autônoma e coerente com o SUS. O segundo trabalho destacou a interação ensino-serviço, com vista a fornecer os subsídios necessários para reorientar o processo de formação nos cursos de graduação inseridos no Pró-Saúde II, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), enriquecendo os currículos para atuação nas redes de atenção à saúde do SUS.

Êxito da formação técnica

A formação técnica para o SUS foi também destaque da Escola Municipal de Saúde (EMS) de São Paulo, vinculada à Secretaria Municipal de Saúde (SMS). A coordenadora em Vigilância em Saúde da SMS, Ana Marisa Tenuta Perondi, apresentou o trabalho Implantando o curso Técnico em Vigilância em Saúde em São Paulo, cujo enfoque foi o grupo de trabalho constituído por representantes da Coordenadoria de Vigilância em Saúde (Covisa) e suas gerências para viabilizar o curso técnico.

De acordo com Ana Marisa, foram promovidas 73 reuniões para construção do conteúdo programático, além de 14 encontros para organização de carga horária, atividades curriculares e estágio supervisionado, 12 capacitações técnico-pedagógicas, 12 cadernos impressos e um manual de trabalho de conclusão de curso (TCC), envolvendo, aproximadamente, 185 profissionais na produção do curso. “O grupo de trabalho responsável pelo curso recomenda que, em São Paulo, seja realizada uma discussão abrangente com todos os setores da saúde para a inserção deste técnico nos serviços , visando otimizar sua atuação e melhorar a qualidade de vida da população”, explicou.

Os profissionais da EMS Fátima Madalena de Campos Lico, Nilva Tiyomi Kitani, Cecilia Cleonice Ribeiro Martins e Ricardo Fernandes de Menezes, por sua vez, apresentaram o trabalho A contribuição da Educação Permanente para a construção da Linha de Cuidado em Saúde do Trabalhador na Rede de Atenção à Saúde, tendo como enfoque a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora no Município de São Paulo e os centros de Referência em Saúde do Trabalhador, para que os mesmos sejam resolutivos e possam desempenhar suas atribuições em sintonia com as redes de Atenção à Saúde.

Segundo Fátima Lico, a integralidade norteou a iniciativa, considerando a categoria trabalho como um dos determinantes do processo saúde-doença. Desse contexto, citou, fez parte o curso Acolhimento e Construção da Linha de Cuidado em Saúde do Trabalhador na Rede de Atenção à Saúde, envolvendo 40 profissionais dos seis centros de Referência em Saúde do Trabalhador de São Paulo. A capacitação contou com uma carga horária de 20 horas, possibilitando a discussão com as equipes nos serviços.

A Secretaria da Saúde de Sobral (CE) apresentou as iniciativas que envolvem a Escola de Formação em Saúde da Família Visconde de Sabóia (EFSFVS), recentemente integrada à RET-SUS. Entre elas, destacou-se a proposta Grupo de convivência na zona rural: o trabalho com exercícios neuróbios representados pelos jogos recreacionais como fator de contribuição na dimensão psíquica dos idosos, desenvolvida por Neires Alves Freitas, residente de Educação Física da EFSFVS.

O trabalho é resultado de um relato de experiência de abordagem qualitativa, desenvolvido com 23 idosos participantes de um grupo de convivência da zona rural de Taperuaba, encontrando justificativa no aumento dessa população e, consequentemente, na necessidade de desenvolver novas estratégias de cuidado, tanto para a saúde individual quanto coletiva. O exercício neuróbio, segundo Neires, implica um tipo de ginástica para o cérebro, com o objetivo de desenvolver a capacidade de raciocínio, percepção e criatividade.

A primeira etapa do estudo consistiu no desenvolvimento de um curso desenvolvido para os idosos, onde se identificou a necessidade de investir em momentos de exercícios neuróbios que trabalhassem a mente, melhorando as conexões nervosas diminuídas com o avanço da idade. “Naquele momento, realizou-se a parte teórica do conteúdo, a partir de uma ação dialogada sob a perspectiva da roda, como proposta de garantir a horizontalidade das relações”, explicou Neires. A segunda etapa correspondeu à parte prática, por meio da aplicação de vários jogos, que funcionam como exercícios neuróbios, tais como jogo da memória, quebra- cabeça, dama e sequência lógica.

Sob o título Ainda lembro do seu caminhar: historicidade e práxis educativa no trabalho do agente comunitário de saúde, a tutora de território da Residência Multiprofissional em Saúde da Família da EFSFVS, Francisca Elzenita Alexandre, apresentou os processos formativos vivenciadas pelos agentes comunitários de saúde do Ceará antes da Lei nº 11.350, de outubro de 2006, que regulamentou a profissão dos agentes comunitários e agentes de endemias em todo país. O trabalho buscou averiguar se os tipos de formações estavam em consonância com as atribuições preconizadas na Política Nacional de Atenção Básica e na Política de Educação Permanente em Saúde, examinar se os processos formativos contribuíram para a construção da práxis educativa do agente e identificar o papel desse profissional como educador comunitário na saúde.  O trabalho de pesquisa fez uso de entrevistas (história oral) com dois idealizadores do Pacs, cinco agentes comunitários de saúde e duas pessoas da comunidade, bem como de documentos escritos, analisados à luz da hermenêutica-dialética, evidenciando a relevância do agente no fortalecimento da ESF na esfera nacional e local e apontando a necessidade de se retomar seu perfil de educador comunitário em saúde.

Aprendizagem significativa

Entendendo que a educação permanente em saúde é, ao mesmo tempo, uma prática de ensino-aprendizagem e uma política de educação na saúde, a EPSJV apresentou a proposta do Mestrado Profissional em Educação Profissional em Saúde, destinado às ETSUS da Região Nordeste. “Esse é o primeiro curso que a EPSJV organiza para a RET-SUS, em parceira com o Ministério da Saúde. É uma demanda antiga das escolas e do próprio ministério, em razão da necessidade de qualificar o corpo docente das escolas da Rede”, anunciou o pesquisador da escola e coordenador do curso, Júlio César França Lima.

O mestrado, segundo ele, pretende atualizar e discutir a dimensão político-pedagógica da formação, sistematizar um olhar crítico sobre as políticas de educação profissional e possibilitar a construção de objetos de investigação que potencializem possíveis avanços no processo de formação profissional. A formação, cuja seleção iniciou em abril, tem duração de dois anos, com regime de oferta diferenciada, já que os alunos são de outros estados, e carga horária de 1.440 horas (60 horas de concentração e 20 horas de dispersão por disciplina). Está organizado em duas etapas: período de concentração, de duração quinzenal; e período de dispersão, que se dará no local de origem de cada aluno. De acordo com Lima, são 21 vagas, distribuídas pelos nove estados do Nordeste — Ceará (3), Bahia (3), Pernambuco (3), Alagoas (2), Maranhão (2), Paraíba (2), Piauí (2), Rio Grande do Norte (2) e Sergipe (2).

Na mesa de debate Diálogos entre educação permanente e atenção primária à saúde, destacaram-se os temas do processo formativo, da problematização dos processos de trabalho e da produção de saúde, encerrando o 11º Congresso da Rede Unida. Coordenadora do Mestrado em Educação para Saúde da Universidade do Minho, em Portugal, a professora Maria Clara Costa Oliveira falou sobre a Atenção Primária e a formação de profissionais de saúde em Portugal. “O sistema de Atenção Primária em Portugal, considerado um dos melhores do mundo, divide-se em Cuidados de Saúde Pública — constituído por médicos e enfermeiros, além de especialistas —, e em unidades de Cuidados na Comunidade (UCCs), cobrindo todo o país”, informou.

As UCCs, segundo ela, têm por missão contribuir para a melhoria do estado de saúde da população da sua área geográfica de intervenção, visando a obtenção de ganhos em saúde e contribuindo, diretamente, para o cumprimento do trabalho do Agrupamento de Centros de Saúde (Aces) ao qual estão integradas. Estas unidades atuam, ainda, na educação para a saúde, na integração em redes de apoio à família e na implementação de unidades móveis de intervenção.  Nesse sentido, integram projetos e programas orientados pela realidade de saúde e social da sua área de intervenção e que tenham como referência o plano de ação do Aces e funcionam em estreita articulação com as outras unidades funcionais, a citar as unidades de Saúde Familiar (USF), de Cuidados de Saúde Personalizados (UCSP), de Recursos Assistenciais Partilhados (URAP) e de Saúde Pública (USP), bem como com a Equipa Coordenadora Local (ECL), no âmbito da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI). As UCCs participam, também, da formação dos diversos grupos profissionais nas suas diferentes fases: pré-graduada, pós-graduada e contínua.

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Um balanço do Caminhos do Cuidado

Durante o Congresso da Rede Unida, a equipe do Projeto Caminhos do Cuidado, voltado para formação em saúde mental (crack, álcool e outras drogas) dos agentes comunitários de saúde, auxiliares e técnicos em enfermagem, reuniu-se com diretores e coordenadores das escolas técnicas do SUS (ETSUS) para uma avaliação da proposta, coordenada pelo Grupo Hospitalar Conceição (GHC), de Porto Alegre, e pelo Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), por meio de convênio com o Departamento de Gestão da Educação na Saúde da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde (Deges/Sgtes/MS). O projeto tem como meta capacitar 290.760 mil profissionais de saúde até o fim deste ano de 2014.

Na oficina A Construção da Educação Permanente, o diretor do Deges, Alexandre Medeiros, lembrou que o projeto provoca novas possibilidades de ações, unindo a Saúde Mental e a Atenção Básica às escolas. “Estamos criando uma estrutura nacional que permita a todos conversarem e entenderem seus papéis e atribuições”, garantiu.

Na oficina Educação permanente enquanto estratégia de transformação do processo de trabalho, a coordenadora executiva do projeto, Edelves Vieira, lembrou que o projeto pressupõe a articulação com as instituições do SUS protagonistas da formação desses trabalhadores, entre elas as escolas técnicas do SUS (ETSUS), centros formadores de recursos humanos do SUS e escolas de Saúde Pública, integrantes da RET-SUS, como também com as áreas de Saúde Mental e Atenção Básica dos três entes federativos e com os conselhos de Secretários Municipais de Saúde. “A formação dos agentes comunitários de saúde e dos auxiliares e técnicos em enfermagem ocorre de forma descentralizada, respeitando a especificidade de cada local e buscando o real sentido da educação permanente”, disse.

A iniciativa se dá em três etapas: os orientadores de aprendizagem, capacitados por meio de uma oficina de formação pedagógica com 24 horas, formam os tutores, que participam de curso com 40 horas de formação presencial e 80 horas de Educação a Distância (EaD), e estes formam os agentes comunitários de saúde e auxiliares e técnicos em enfermagem, por meio de uma capacitação de 60 horas, sendo 40 horas presenciais e 20 horas de dispersão. A última etapa de formação, especialmente, conta com a participação direta das escolas da RET-SUS (ver Revista RET-SUS nº 64, de abril de 2014).

O coordenador nacional de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Roberto Tykanori, ao participar da távola Projeto Caminhos do Cuidado: articulando a rede de cuidados em saúde mental, sob a perspectiva da redução de danos, observou que o projeto possibilita um processo de qualificação de profissionais conscientes e solidários, preocupados com o sofrimento alheio, “sem deixá-los engessados por normas e formulários”.

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