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A formação profissional em Saúde Bucal para o SUS

Brasil Sorridente completa dez anos, devolvendo a autoestima a milhões de brasileiros e reconhecendo as ETSUS como parceiras na formação de seus profissionais.

Flavia Lima

 

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), uma boca saudável é aquela que apresenta ausência de dor, câncer, feridas e outras doenças na cavidade oral, entre elas a cárie — que afeta 80% da população mundial. A definição impulsionou o Programa Brasil Sorridente, lançado pelo Ministério da Saúde (MS) em 2004. Aos dez anos de existência, completados neste ano de 2014, o programa soma 80 milhões de brasileiros atendidos e mil centros de Especialidades Odontológicas (CEOs) instalados, além de outros 205 em fase de construção, para fazer frente ao desafio de ampliar e qualificar a oferta de serviços odontológicos especializados. Segundo o coordenador de Saúde Bucal do MS, Gilberto Pucca, 90% das cidades do país já contam com, pelo menos, um dentista para assistir a população que mais precisa. “O Brasil Sorridente resgatou milhões de sorrisos e devolveu a autoestima a milhões de brasileiros”, comemorou.

Pucca lembrou que o programa é reconhecido no mundo e considerado marco na área da atenção à saúde bucal brasileira. “O Brasil não dispunha de ações que articulassem o acesso universal e a integralidade em saúde bucal no SUS. Ao longo dos anos, a odontologia esteve à margem das políticas públicas de saúde e o acesso dos brasileiros à saúde bucal era extremamente difícil e limitado”, observou, ressaltando que os serviços odontológicos, em geral, eram ofertados pelo setor privado. “A boca no Brasil era um estatuto de classe”, frisou. Vale citar que a maioria dos municípios brasileiros desenvolvia ações para a faixa etária escolar, de 6 a 12 anos, e gestantes. Os adultos e os idosos tinham acesso apenas a serviços de pronto atendimento e urgência, geralmente mutiladores. “Isso caracterizava a odontologia como uma das áreas da saúde com extrema exclusão social”, recordou. Segundo o Levantamento Nacional de Saúde Bucal (SB Brasil), em 2003, 13% dos adolescentes nunca tinham ido ao dentista, 20% da população brasileira já tinha perdido todos os dentes e 45% dos brasileiros não tinham acesso regular a escova de dente.

Avanço reconhecido

A ampliação do acesso aos serviços de saúde bucal promovida pelo programa é potencializada por ações intersetoriais, com destaque para a fluoretação das águas de abastecimento público, o Plano Brasil sem Miséria e os programas Territórios da Cidadania, Saúde na Escola, Nacional de Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) e dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Tais iniciativas, observou Pucca, “colaboraram para a desmonopolização do cuidado em saúde bucal dos segmentos de renda mais alta, o rompimento do ciclo intergeracional dos desdentados e, principalmente, o resgate da cidadania da população brasileira”.

Ele destacou, também, a Lei nº 11.889, de 24 de dezembro de 2008, que regulamentou as profissões de técnico e auxiliar em saúde bucal, a implantação de quase 20 mil novas equipes de Saúde Bucal (ESB) na Estratégia Saúde da Família e o aumento em mais de 110% do número de municípios brasileiros com, no mínimo, uma ESB, além da doação de mais de oito mil equipamentos odontológicos para estruturação da rede de saúde bucal, o fato de mais de sete milhões de pessoas passarem a ter acesso à água tratada e fluoretada e a implantação de cerca de 1.400 laboratórios regionais de Próteses Dentárias. “Em dez anos, foram ofertadas mais de 2,1 milhões de próteses dentárias pelo SUS”, revelou.

Segundo Pucca, o SUS é, hoje, o grande empregador na área odontológica. “Houve um aumento de 50% no número de cirurgiões-dentistas no sistema”, contou. A área somava, antes do Brasil Sorridente, cerca de 43 mil profissionais contra os atuais 65 mil profissionais que atuam nas 23,6 mil equipes de saúde bucal implantadas no Brasil. “Estas equipes estão presentes em  4.978 municípios. Ou seja, 89% dos municípios brasileiros contam com, no mínimo, uma ESB composta por cirurgião dentista e auxiliar e/ou técnico em saúde bucal”, enumerou. “Conseguimos expandir, universalizar e, também, crescer com equidade”, disse, referindo-se ao maior aumento no acesso aos serviços de saúde bucal das famílias que recebem até dois salários mínimos. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), o índice de pessoas de baixa renda (até dois salários mínimos por família) que nunca tinham sido tratadas caiu de 17,9% para 13,6% entre 2003 e 2008. Isso significou a inclusão de 17,5 milhões de brasileiros.

Investimento na formação

Em dez anos de programa, já foram investidos mais de R$ 7 bilhões na área. Somente no campo da pesquisa, foram investidos mais de R$ 5 milhões, por meio da parceria com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). O governo federal passou a investir, também, nos CEOs, por meio do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade para Atenção Básica (Pmaq-AB). “Somente em 2013, foram investidos mais de R$ 14 milhões nesta iniciativa”, destacou Pucca, citando também o ano de 2011, quando o MS investiu cerca de R$ 219,4 mil nas equipes de saúde bucal da Atenção Básica.

O investimento acontece, ainda, na formação dos profissionais de saúde bucal e prótese dentária. Para o coordenador da área, o programa encontra nas escolas técnicas e centros formadores de recursos humanos do SUS o parceiro ideal para formar trabalhadores conforme a necessidade do sistema. “O MS investiu, em 2012, R$ 6 milhões na formação de técnicos em próteses dentárias, principalmente em regiões com escassez desse profissional, por meio do Programa de Formação de Profissional de Nível Médio para a Saúde (Profaps)”, contou. A formação, em geral promovida pelas escolas da RET-SUS, permitiu ao Brasil Sorridente oferecer 471 mil próteses em 2013, superando a meta estabelecida pelo Plano Brasil Sem Miséria. “Ou seja, 20 vezes mais que há dez anos, quando foram ofertadas 22 mil próteses”, comparou.

Em maio de 2014, a Escola Técnica do SUS de Sergipe (ETSUS-SE) iniciou sua primeira turma do curso Técnico em Prótese Dentária. Com 1.306 horas de aulas e 21 alunos, a formação encontrou justificativa na ausência de profissionais capacitados para dar conta da demanda do estado. Segundo a coordenadora do curso, Eleonora de Oliveira Bandolin Martins, a previsão é ter novos técnicos em prótese dentária formados no primeiro semestre de 2016.

A ETSUS-SE realizou, ainda, entre junho de 2010 e dezembro de 2013, o curso Técnico em Saúde Bucal, envolvendo 67 municípios. A coordenadora da formação, Tereza Mônica Leite Fraga, conta que a iniciativa, organizada em 1.500 horas de aulas, permitiu formar 405 novos profissionais aptos a atuar de forma consciente e participativa, como agentes de consolidação do SUS. “O crescimento técnico-científico desses profissionais resulta na melhoria da saúde bucal da comunidade”, observou.

Segundo Tereza, o curso encontrou justificativa na necessidade de profissionais para atuarem nas equipes de saúde bucal da ESF. “Tal movimento gerou um aumento na oferta de trabalho para os auxiliares e técnicos em saúde bucal, numericamente menor que os cirurgiões dentistas”, comparou. Os novos técnicos foram formados segundo um conceito de saúde abrangente, que não se limita à realização de procedimentos técnicos. “Eles tomam ciência de seu papel transformador enquanto atores do SUS”, concluiu, anunciando que uma nova turma do curso técnico deverá ser formada em 2015, dando conta da demanda de alguns municípios. A escola já formou, ao todo, 202 auxiliares e 192 técnicos em saúde bucal.

O Centro Formador de Recursos Humanos da Paraíba (Cefor-PB) segue na mesma direção. A escola tem o curso Técnico em Saúde Bucal (TSB) em execução e o projeto de uma primeira turma do Técnico em Prótese Dentária aprovado. Segundo a diretora pedagógica da escola, Aline Poggi Lins de Lima, o TSB abarca os municípios de João Pessoa, Bananeiras, Guarabira e Sapé, tendo previsão de término em outubro deste ano. A formação visa à transformação das práticas de saúde e encontrou justificativa na necessidade de profissionais com formação técnica em saúde bucal para atuar no sistema, segundo um levantamento feito pela própria escola. São 157 trabalhadores em curso.

Em 2009, a Escola de Formação em Saúde da Família Visconde de Sabóia, em Sobral (CE), iniciou o Técnico em Saúde Bucal. Segundo a coordenadora geral da instituição, Nara Lúcia Costa Farias, cinco turmas foram iniciadas — uma em cada região de saúde — em Acaraú, Camocim, Crateús, Sobral e Tianguá. A formação, concluída em 2011, foi organizada em 1800 horas de aula, sendo 1.200 horas de teoria e prática e 600 horas de estágio supervisionado. Foram formados 150 profissionais. “As regiões apresentaram nas comissões Permanente de Integração Ensino-Serviço (Cies) uma grande demanda de formação de trabalhadores para atuar nos consultórios odontológicos dos municípios”, revelou Nara, ressaltando que o curso contou com recursos da Política Nacional de Educação Permanente.

Os objetivos do curso técnico são: habilitar e qualificar o trabalhador, priorizando o desenvolvimento de competências relativas às práticas técnicas, éticas, humanísticas; desenvolver a formação profissional da macrorregião de Sobral, tornando o profissional apto a conhecer e intervir sobre os problemas e situações de saúde e doença do ser humano, segundo os princípios e diretrizes do SUS; proporcionar conhecimentos contextualizados na área, considerando os aspectos políticos, socioeconômicos, culturais e ambientais; oportunizar o desenvolvimento de habilidades para atuar em equipe, aplicando os princípios éticos e de cidadania; e habilitar técnicos em saúde bucal com capacidade de transformar a realidade assistencial, observando adequadamente o compromisso e a ética profissional exigida no desempenho das suas funções, prioritariamente nos serviços odontológicos do SUS.

Imbuída da missão de formar profissionais capazes de prestar atenção integral e humanizada aos usuários do SUS, a direção da Escola Técnica de Saúde do Centro de Ensino Médio e Fundamental da Universidade Estadual de Montes Claros (ETSUS Unimontes) elaborou um projeto para formação e capacitação de auxiliares de consultórios dentários e técnicos em higiene dental. Em setembro de 2013, iniciou uma turma do Técnico em Saúde Bucal, com 34 alunos, em parceria com a Associação Brasileira de Odontologia e a Residência de Odontologia da Unimontes. “As demandas para este curso surgiram com o aumento da condição social e cultural dos brasileiros, que propiciou uma valorização da saúde bucal”, revelou a coordenadora da formação, Elizabeth Sandra Souza Xavier. De acordo com ela, a atenção integral, universal e equitativa na área de saúde bucal preconizada pelo Ministério da Saúde provocou a ampliação da formação de auxiliares e técnicos na área.

O Centro Formador de Recursos Humanos Caetano Munhoz da Rocha, em Curitiba, vinculado à Escola de Saúde Pública do Paraná, oferece o curso Técnico em Saúde Bucal, tendo como foco o SUS. A turma de 40 alunos iniciou a formação em junho de 2013 e tem a formatura prevista para dezembro deste ano. Segundo a coordenadora pedagógica, Cristiane Maria Rotava, a formação destina-se aos trabalhadores do sistema de saúde e tem como finalidade consolidar os atendimentos nos CEOs, nas equipes de saúde da família e nas unidades básicas de saúde. “A escola já formou mais de 1.700 alunos técnicos na área”, contou.
 

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