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Inovação na formação em Enfermagem

Em sua 14ª edição, o Seminário Nacional de Diretrizes para a Educação em Enfermagem traz para o debate o ensino para uma formação ética e responsável.

Flavia Lima


Sob o tema Educação em Enfermagem: qualidade, inovação e responsabilidade, a Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn) promoveu, de 6 a 8 de agosto, o 14º Seminário Nacional de Diretrizes para a Educação em Enfermagem (SENADEn), em em Maceió (AL), reunindo cerca de 700 participantes de vários estados brasileiros e países da América Latina, Caribe e Portugal, bem como a Rede de Escolas Técnicas do SUS (RET-SUS). Estruturado em três eixos temáticos — Modelos pedagógicos inovadores potentes para a formação generalista, ética e responsável de profissionais de enfermagem; Formação em Enfermagem e o cenário atual do trabalho em saúde nacional e internacional; e Pós-Graduação e Pesquisa —, o evento agregou, ao todo, 550 trabalhos científicos e relatos de experiências. “A presença de vários segmentos da educação, bem como das escolas técnicas do SUS, culminou em um caldeirão de ideias e propostas”, observou a presidente da ABEn e do 14º SENADEn, Ângela Maria Alvarez. “Devemos consolidar ainda mais essa parceria com a Rede”, anunciou. Não por um acaso que o Seminário Nacional da RET-SUS aconteceu concomitantemente ao 66º Congresso Brasileiro de Enfermagem (CBEn), organizado pela ABEn, de 27 a 30 de outubro, em Belém (PA).

Seguindo a tradição, o 14º SENADEn — realizado em parceria com a Universidade Federal de Alagoas (Ufal) — foi dividido em conferências, mesas-redondas, cursos, oficinas, reuniões de interesse, fóruns, atividades culturais e lançamento de produções acadêmicas, além da Tenda de Educação Popular em Saúde Damião Alexandrino, culminando na aprovação da Carta de Maceió para a Educação em Enfermagem (documento editado no box da pág.07), cujo objetivo foi favorecer o envolvimento e o compromisso da comunidade acadêmica com as questões relativas à política de formação profissional e propiciar a discussão à respeito de parcerias institucionais, internas e externas à Enfermagem. “Esse evento tem oportunizado debates e reflexões que se tornaram proposições de reformulação das diretrizes curriculares na área”, esclareceu Ângela.

Ela discorreu, ainda, sobre o compromisso da associação com as causas relacionadas ao desenvolvimento técnico, científico e político da categoria, a exemplo da participação da ABEn na mobilização pela regulamentação da jornada semanal de trabalho de 30 horas para a Enfermagem. “Não há acordo para inclusão do Projeto de Lei sobre o tema na pauta da Câmara dos Deputados, diminuindo nossas chances de ter a proposta aprovada ainda neste ano, mas continuamos na luta”, destacou, referindo-se ao Projeto de Lei nº 2.295/2000, que há 14 anos tramita na Casa Parlamentar.

Intensa participação

Na roda de conversa Capacitação de Facilitadores do Curso Qualidade e Segurança do Paciente, o objetivo foi apresentar a proposta de formação que envolve profissionais da enfermagem de hospitais e das ETSUS. O curso, organizado pelo Ministério da Saúde e Hospital Sírio Libanês, tem como objetivos promover a discussão e a disseminação do conceito de segurança do paciente e fortalecer os núcleos de segurança do paciente nas organizações de saúde, por meio da capacitação de enfermeiros facilitadores. Segundo o coordenador-geral de Ações Técnicas em Educação na Saúde do Departamento de Gestão da Educação na Saúde da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde (Deges/Sgtes/MS) e da RET-SUS, Aldiney José Doreto, a meta é atingir, na primeira etapa, 200 profissionais — 80% provenientes de hospitais e 20% das ETSUS. Os encontros — que serão presenciais — acontecem entre agosto e dezembro deste ano, colocando em debate questões como protocolos de segurança, ferramentas de ensino e qualidade, além do próprio Programa Nacional de Segurança do Paciente.

Na mesa-redonda Quantitativo versus qualitativo dos cursos de Enfermagem: quem sai ganhando?, Doreto, que é formado em Enfermagem, falou sobre o tema da demografia e do mercado de trabalho do enfermeiro no Brasil, a partir de uma pesquisa que traz a variação percentual de concluintes por curso de graduação em Saúde no Brasil, no período de 2000 a 2010. Segundo o levantamento, a Enfermagem foi responsável pelo maior percentual (21%) de concluintes na área da Saúde, em 2010, seguida pela Educação Física (16%). Quanto ao curso de Medicina, o número de concluintes cresceu 74% neste período. No entanto, sua participação caiu de 13%, em 2000, para 6%, em 2010. Na análise por região brasileira, a pesquisa revelou crescimento dos cursos de graduação em Saúde de 65%, em média, nas regiões Sul e Sudeste. As regiões Norte e Nordeste tiveram, também, um expressivo aumento: Norte ampliou de 57 para 359 cursos (529%); e Nordeste, de 172 para 904 (425%). Já a região Centro-Oeste cresceu 311% em dez anos.

Na mesa-redonda Educação Técnica em Enfermagem e Saúde: desafios e perspectivas, Doreto abordou a importância da RET-SUS na formação profissional técnica e na qualidade dessa formação para o SUS. Segundo ele, as escolas integrantes da Rede estão organizadas e estruturadas conforme os requisitos e padrões normativos e legais estabelecidos pela área da Educação e as demandas das políticas de Saúde do SUS, tendo como foco a formação e a qualificação do trabalhador que está em serviço. “É imprescindível que as ETSUS ampliem suas articulações com organismos e colegiados do SUS, como as comissões de Integração Ensino-Serviço (Cies), bem como da Educação, como os conselhos estaduais de Educação (CEE), para que se tornem cada vez mais protagonistas no plano das negociações das políticas de Saúde e Educação nos estados e municípios”, recomendou.

Ele destacou como desafios para as escolas da Rede — ao todo, 40 — a integração da diversidade, a multiplicidade de atores influenciando o processo de decisão, execução e controle do processo educacional, a estrutura policêntrica, o espaço de produção de conhecimento e pesquisas avaliativas no impacto da formação na qualificação das práticas laborais do trabalhador e a execução do Programa de Formação de Profissionais de Nível Médio para a Saúde (Profaps) do Ministério da Saúde, lançado em dezembro de 2009 e cuja aposta foi a formação técnica em Vigilância em Saúde, Radiologia, Citopatologia e Hemoterapia, além das áreas de Saúde Bucal, Prótese Dentária, Manutenção de Equipamentos e Enfermagem. “A RET-SUS precisa ser mais proativa nos processos pedagógicos e de gestão, repensando, reformulando ou adequando o projeto político pedagógico das escolas”, orientou.

Seguida a Doreto, a pedagoga e mestre em Ciências da Saúde, Ena de Araújo Galvão, diretora da Escola Técnica de Saúde de Brasília (Etesb), apontou os principais desafios da formação técnica, pós-técnica e da educação permanente em enfermagem, na perspectiva do fortalecimento da categoria e da melhoria da qualidade do cuidado à saúde. Entre os desafios destacou o desenvolvimento da autonomia do estudante, a integração dos conhecimentos, a formação para o SUS na perspectiva individual, familiar e de grupos sociais, a articulação entre formação e trabalho, a centralização do processo educativo na figura do aluno, a avaliação do docente, do aluno e do processo ensino-aprendizagem, a identificação das competências que constituam o referencial para a formação, bem como a construção de sistemas de validação de competências e profissionais egressos, o desenvolvimento da capacidade de constante adaptação às mudanças, a apropriação da tecnologia como ferramenta pedagógica e a compreensão das exigências impostas pelo processo produtivo. “A educação para o século 21 está sobre quatro pilares: aprender a conhecer; aprender a fazer; aprender a conviver; e aprender a ser”, citou, fazendo alusão às orientações do economista e político francês Jacques Delors, no livro Educação: um tesouro a descobrir.

Perspectivas

A diretora de Políticas de Educação Profissional e Tecnológica da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação (Setec/MEC), Nilva Schroeder, pontuou os desafios e as perspectivas da educação técnica em Enfermagem. Segundo ela, é preciso promover a integração entre políticas de trabalho, educação e desenvolvimento social e econômico, bem como a concepção de educação como direito, a articulação entre as ações voltadas à educação profissional e as políticas estruturantes de inclusão social, combate à pobreza e redução das desigualdades regionais, a promoção de ações afirmativas para atender aos grupos em situação de vulnerabilidade social — vítimas de preconceito e de discriminação —, o regime de coordenação e cooperação, o diálogo, a participação e o controle social e a aderência de ofertas e demandas. “Precisamos de um projeto pedagógico que seja a expressão de um posicionamento ético, político e epistemológico”, frisou, defendendo uma formação técnica integral, com foco no desenvolvimento para a vida social e profissional, no trabalho como princípio educativo e na integração com a ciência, a tecnologia e a cultura, além da pesquisa como princípio pedagógico, a superação da fragmentação do conhecimento e da segmentação curricular.

Na mesa-redonda Políticas de integração em Educação de Enfermagem para a América Latina e Caribe, o vice-presidente da Federação Pan-Americana de Profissionais de Enfermagem e professor da Faculdade de Enfermagem Lídia Doce, em Havana (Cuba), Carlos Agustin León Róman, ressaltou a necessidade de se desenvolver mecanismos de cooperação técnica e colaboração com os ministérios da Saúde da América Latina e Caribe, com foco na promoção de políticas e planos nacionais de desenvolvimento da Enfermagem. “É essencial que nossos líderes se concentrem sobre a força de trabalho da Enfermagem para que consigamos alcançar uma melhor saúde para todos”, indicou.

A professora titular do Departamento de Enfermagem Fundamental da Escola de Enfermagem Anna Nery, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Márcia Assunção Ferreira, abordou os desafios da pós-graduação em Enfermagem na América Latina e Caribe quanto ao tema da integração. Entre eles, destacou o planejamento e o financiamento como exigências prévias a qualquer tentativa de integração, a infraestrutura, tanto material quanto pessoal, para que se possam garantir meios de alcançar os fins dos acordos, o domínio das línguas espanhola e portuguesa, as políticas econômicas e prioritárias de governos na destinação de verbas orçamentárias para Educação, Ciência e Tecnologia, face às diversas crises próprias do momento atual, e a busca de recursos nos organismos nacionais e internacionais. “O que nos é possível constatar é a necessidade urgente de um projeto político para a Enfermagem, uma vez que a integração é requerida pela atual conjuntura político-social dos países que formam a região”, observou.


BOX

Carta de Maceió para a Educação em Enfermagem no Brasil

Aprovada na plenária final do 14º SENADEn, o documento traz 26 recomendações. São elas, resumidamente:

1. Assumir a ordenação da formação de profissionais de Enfermagem para atender as demandas do SUS e da população brasileira.

2. Revisar e atualizar as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para a formação do enfermeiro.

3. Adequar os referenciais curriculares para a formação profissional de nível médio, no que concerne à Enfermagem e às mudanças do modelo de atenção à saúde.

4. Estabelecer portaria interministerial para regulamentar o papel do CNS no processo de abertura, reconhecimento e renovação de reconhecimento de cursos de graduação em Enfermagem.

5. Criar o Observatório de Recursos Humanos em Enfermagem.

6. Rever os critérios adotados nas análises de empregabilidade da força de trabalho da Enfermagem no Brasil.

7. Aplicar os indicadores previstos no Instrumento de Avaliação de Cursos de Graduação presencial e a distância, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira do Ministério da Educação (Inep/MEC).

8. Incluir a Enfermagem como parte do conjunto das demandas de campos de práticas no SUS, assegurando cenários de práticas clínicas e de estágio supervisionado.

9. Incluir a Enfermagem na definição da política nacional de preceptoria, para a formação no nível de graduação, residência e formação profissional de nível médio.

10. Recomendar ao Conselho Nacional de Educação (CNE) que estabeleça portarias normativas para a formação das profissões de saúde.

11. Ampliar o número de programas de residência por área profissional e multiprofissional.

12. Investir na melhoria da qualidade dos programas de residência em funcionamento.

13. Fomentar estudos que analisem o impacto dos egressos dos programas de residência nos serviços de saúde.

14. Ampliar a oferta de programas de Residência Multiprofissional em Saúde, com distribuição mais equitativa no território nacional.

15. Reativar a Comissão de Especialistas em Educação em Enfermagem, junto à Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior do MEC.

16. Revitalizar os debates e as iniciativas de formação de especialistas de Enfermagem para atender às necessidades de cuidados em saúde de mulheres, crianças, jovens, adultos e idosos.

17. Recomendar à Capes que aperfeiçoe ou amplie as políticas indutoras de formação de mestres para o exercício da docência nos cursos de Saúde.

18. Propor o redimensionamento da oferta de vagas nos cursos, escolas e faculdades de Enfermagem.

19. Reiterar os termos contidos no documento-base dos conselhos profissionais da área de saúde, contrários à formação em Enfermagem na modalidade EaD, no âmbito da graduação e do ensino profissional de nível médio.

20. Criar o Fórum de Avaliadores de Curso de Enfermagem do Inep, prevendo encontros no CBEn e SENADEn.

21. Propor diretrizes para o desenvolvimento de uma política de preceptoria para as atividades práticas e o estágio supervisionado na graduação e na formação profissional de nível médio em Enfermagem.

22. Estabelecer parâmetros de qualidade para a formação em Enfermagem.

23. Propor diretrizes que estimulem a convergência de currículos para a formação em Enfermagem, em especial entre os países da América Latina e Caribe.

24. Aprofundar estudos e debates sobre a formação de professores para o exercício da docência na educação básica e na educação profissional de nível médio em Enfermagem, com prioridade para a licenciatura em Enfermagem.

25. Participar do debate e das deliberações do Programa Brasil Profissionalizado.

26. Criar o Departamento de Educação Popular em Saúde na ABEn, para estimular a transformação das atividades de Educação em Saúde.
 

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