escola em foco
Protagonista da formação técnica em saúde no estado
Escola de Pernambuco promove de forma inédita seminários sobre o curso Técnico em Análises Clínicas, se destacando no processo de formação para o SUS.
Ana Paula Evangelista
Práticas inéditas e exitosas fazem da Escola de Governo em Saúde Pública de Pernambuco (ESP-PE) protagonista da formação técnica no estado. Exemplo nesse sentido, o 1º Ciclo de Seminários de Formação Técnica Profissional em Análises Clínicas, promovido em Arcoverde (PE) — cidade que sediou o curso Técnico em Análises Clínicas, como parte do processo de descentralização —, em dezembro de 2014, contou com a participação de 23 alunos. O evento marcou o encerramento do curso, destinado aos trabalhadores dos cinco municípios (Arcoverde, Ibimirim, Sertânia, Tupanatinga e Venturos) da 4ª Gerência Regional de Saúde, localizada na Mesorregião do Sertão, resultando na apresentação de relatos resumidos dos estágios supervisionados. “O objetivo principal do evento consistiu em promover uma reflexão crítica sobre os procedimentos técnicos realizados ou observados pelos alunos durante o período das atividades práticas”, explicou a gerente da ESP-PE, Célia Borges.
Divididos em seis grupos, os alunos apresentaram um consolidado das atividades desenvolvidas e observadas nos diversos setores das análises clínicas, passando pela recepção e coleta, urinálise, bioquímica clínica, hematologia, biofísica e parasitologia, em atenção às 240 horas de estágio curricular. Eles revelaram, ainda, os resultados dos trabalhos de pesquisa prática nas áreas de Hormonologia Clínica, Imunologia, Virologia, Bacteriologia e Micologia.
O trabalho veio ao encontro do objetivo da formação, que é capacitar o técnico em análises clínicas para trabalhar em laboratórios clínicos de hospitais, clínicas, emergência, banco de sangue, pesquisa e controle biológico e em indústrias alimentícias e farmacêuticas, sendo capaz de desenvolver coleta de material biológico, manipular substâncias químicas, preparar amostras, realizar a limpeza, a esterilização e a secagem de materiais, documentar as análises, manejar, calibrar e conservar os equipamentos do laboratório. Todas essas atividades devem obedecer às normas de controle de qualidade e de biossegurança. O curso compreendeu 1.400 horas de aulas, divididas em 1.200 horas de teoria e 240 horas de estágio supervisionado.
Em prol do SUS
Na avaliação do coordenador da área de apoio e diagnóstico do curso técnico, Mário Correia, a formação possibilitou a inovação da composição tecnológica das unidades de saúde sediadas em municípios distantes das cidades de referência e, consequentemente, distantes da capital. “O reconhecimento da experiência profissional dos trabalhadores da área, adquirido ao longo do tempo em sua jornada de trabalho, sendo transformada em carga horária a favor do aluno, foi o diferencial para os trabalhadores e para o mundo do trabalho”, observou.
Uma das principais contribuições da formação para a região foi a possibilidade do Laboratório Central de Pernambuco (Lacen) promover a descentralização de serviços que eram realizados apenas nos grandes centros urbanos, a exemplo da implantação do Laboratório de Microbiologia no Hospital Regional do Agreste de Caruaru. Outro ponto positivo foi a possibilidade de integração dos demais profissionais de saúde que não estavam inseridos como aluno no curso e passaram a participar diretamente do processo ensino-serviço a partir das práticas pedagógicas realizadas em espaços de trabalho que nunca tiveram tal foco. “Isso também implica a promoção da qualidade do atendimento, bem como a ampliação e a agilidade dos resultados dos exames e dos serviços de saúde correlacionados com a área técnica, por meio de uma rede de unidades de saúde estadual e municipais”, observou a coordenadora da área de ações educacionais da ESP-PE, Neuza Buarque.
Ela revelou que, geralmente, nas cidades do interior, as aulas teóricas acontecem em instituições públicas de ensino parceiras ou nas sedes das gerências regionais de Saúde e as aulas que implicam atividades práticas, nos laboratórios de Saúde Pública das secretarias municipais de Saúde ou dos hospitais regionais. “Geralmente, são escolas que funcionam em turno integral e têm capacidade para atender a diversos públicos”, explicou. Em Arcoverde, por exemplo, as aulas teóricas foram realizadas no turno da noite, de segunda a sexta-feira, em uma escola estadual de referência para o estado. Já, as aulas práticas nos laboratórios públicos da região. “As atividades realizadas nos espaços dos laboratórios visaram identificar as habilidades técnicas de bancada, considerando a especificidade de cada área do conhecimento. Na ocasião, os alunos, além de realizarem a prática adotada, teriam que responder e esclarecer as indagações dos integrantes do comitê de avaliação, caso fosse necessário”, contou Correia.
Para que o curso em Arcoverde fosse iniciado conforme planejado, os docentes foram credenciados por processo público e, em seguida, passaram por formação pedagógica de 40 horas. Eles foram responsáveis pela construção do material didático. Já os conteúdos programáticos previstos no plano de curso e, consequentemente, nos planos de disciplina, foram definidos a partir de um processo de construção coletiva entre os profissionais da ESP-PE, docentes e trabalhadores especializados dos serviços de saúde.
Marca da descentralização
Considerando que a maioria das turmas do curso Técnico em Análises Clínicas ocorreu de forma descentralizada, em municípios que ficam a quase duas horas de distância da capital — o que dificulta a equipe de supervisão central ter acesso a todas as informações semanais das atividades —, foi criada uma planilha eletrônica com o espelho do diário de classe. Essa planilha, conhecida como SAS e compartilhada entre os profissionais da equipe de apoio ao curso, calculava o percentual de falta e contabilizava os conceitos que os alunos recebiam. “Isto possibilitou minimizar os problemas de reprovação por faltas, além de identificar o aluno com dificuldade de aprendizagem e, consequentemente, com baixo desempenho”, esclareceu Célia.
Outra experiência que ajudou para o sucesso do curso foi a alternativa de realizar pelo menos 20% dos conteúdos teóricos de cada disciplina nos moldes da Educação a Distância (EaD). Durante o processo de planejamento de aula foram destacados alguns temas técnicos que perpassavam pelas atividades cotidianas do trabalhador em análises clínicas para que o aluno fizesse a leitura de um texto ou levasse um estudo de caso para ser debatido com os demais profissionais. “Essa estratégia tem sido vista com muita positividade nas avaliações, pois faz o aluno refletir sobre sua prática e possibilita a materialização da pedagogia da problematização, tornando o aprendizado mais significativo”, revelou Correia.
Além disso, ao fim de cada módulo, a coordenação da área técnica aplicava um instrumento de avaliação, que era preenchido pelos alunos sem a necessidade de identificação. O instrumento era composto por três categorias de avaliação — do curso em si (local das aulas, conteúdos ministrados, equipamentos e materiais didáticos disponibilizados, insumos, assistência da equipe técnica etc.); do docente (domínio dos conteúdos, uso de material multimídia, valorização dos conhecimentos anteriores e das experiências de trabalho, cumprimento da carga horária, entre outros); e uma autoavaliação (participação durante as aulas, frequência, assiduidade, desenvolvimento e integração ao curso). Os dados eram consolidados e os resultados das avaliações transformados em gráficos e discutidos nos conselhos de classe.
Histórico
Em 2008, a ESP-PE deu início a sua primeira turma de técnicos em análises clínicas. Ainda projeto piloto, centralizado em Recife, o curso beneficiou na época 61 trabalhadores da capital Recife e Região Metropolitana, que inclui Abreu e Lima, Camaragibe, Paulista e São Lourenço. Em março de 2009, a escola abriu duas novas turmas descentralizadas da formação, com sede em Caruaru, abarcando 60 alunos de 12 municípios da Região Agreste (Caruaru, Agrestina, Altinho, Bezerros, Bonito, Brejo da Madre de Deus, Cachoeirinha, Jataúba, Pesqueira, Riacho das Almas, Sanharó e São Joaquim do Monte). Em maio de 2009, mais duas turmas foram promovidas em Palmares, com 69 alunos matriculados, oriundos de 11 municípios da Região Mata Sul (Palmares, Água Preta, Barreiros, Catende, Cortês, Gameleira, Joaquim Nabuco, Lagoa dos Gatos, Maraial, Ribeirão e São José da Coroa Grande). Por fim, em setembro de 2012, foi a vez de Arcoverde, cuja formação foi iniciada com 45 alunos, provenientes dos cinco municípios da região que abarca os municípios de Arcoverde, Ibimirim, Sertânia, Tupanatinga e Venturos. O curso encontrou justificativa no perfil epidemiológico, na demanda de exames, na carência de profissionais com qualificação técnica na área, bem como na necessidade de fortalecimento do processo educacional em saúde na perspectiva de integrar o ensino e o serviço.
De acordo com Célia, a ESP-CE já formou 139 alunos como técnicos em análises clínicas, representando cerca de 60% de todas as matrículas. Isso implicou a promoção da identidade profissional dos trabalhadores que atuam nos laboratórios de saúde pública de quatro regiões economicamente impactantes para o estado e para o SUS, em atenção ao contexto da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde e à demanda de exames em laboratórios ambulatoriais e de emergência da rede de serviços públicos
BOX
ESP-PE na modalidade Residência em Saúde
Em resposta à necessidade de formação e fixação de especialistas de forma regionalizada e descentralizada, na modalidade Residência em Saúde, e visando atender às demandas do SUS, a ESP-PE e a Universidade de Pernambuco — Campus Garanhuns — elaboraram colaborativamente o Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Coletiva, com ênfase na Gestão de Redes de Saúde. A iniciativa propõe uma formação especializada em serviço, com 56 vagas financiadas pelo Ministério da Saúde, compreendendo diferentes áreas profissionais, tais como Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Nutrição, Psicologia, Serviço Social, Terapia Ocupacional e Odontologia.
Os profissionais de saúde residentes serão acompanhados, nas regionais de saúde, pelo Orientador Clínico Pedagógico (OCP), que também é responsável pela articulação com os preceptores e os locais de prática e pela integração dos conhecimentos teóricos com as atividades práticas no território de atuação. Além disso, para cada regional de saúde, haverá um tutor de referência da ESP-PE, que tem a função de aprofundar os aspectos políticos e pedagógicos da formação do residente, articulando a discussão teórica com os aspectos práticos e políticos vivenciados nos serviços e nos espaços de gestão.
Esse programa é fruto de uma conquista recente da escola que, em janeiro, em plenária da Comissão Nacional de Residência Multiprofissional em Saúde, teve aprovado o credenciamento para a certificação de pós-graduação lato sensu na modalidade Residência em Área Profissional de Saúde, além da Comissão de Residência multiprofissional.
Nesse contexto, portanto, a ESP-PE assumiu, também, a execução de outros dois programas, da Residência Multiprofissional de Interiorização de Atenção à Saúde – Hospital Regional Dom Moura (Garanhuns-PE) e da Residência Multiprofissional em Saúde Coletiva do Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães (CPqAM) — unidade da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Pernambuco.
O primeiro tem como propósito assegurar um atendimento qualificado, de acordo com as demandas da população de Garanhuns e entorno. Do ponto de vista da concepção teórico-pedagógica, o curso compreende que a saúde deve ser trabalhada de forma coletiva, superando as fragmentações especializadas e individualizantes, e, consequentemente, entende que o profissional de saúde deve ter uma formação ampla e consistente, uma vez que atua tanto em relação a indivíduos quanto em relação a comunidades e famílias. O segundo programa tem como propósito formar sanitaristas comprometidos com os princípios da Reforma Sanitária, por meio de um processo pedagógico referenciado na reflexão crítica sobre a prática da saúde coletiva, aliando competência técnica aos princípios éticos na práxis profissional. O curso propõe um modelo de currículo organizado em atividades e experiências planejadas e orientadas que possibilitem aos alunos a construção da trajetória de sua profissionalização, estimulando práticas de estudos independentes com vistas à progressiva autonomia intelectual e profissional.
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