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Os caminhos da saúde pública em meio à crise

Saúde Coletiva reitera compromissos com o direito social, com críticas ao subfinanciamento e à lógica de privatização do setor.

Ana Paula Evangelista e Flavia Lima
 

Como de tradição, o Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva — o Abrascão —, em sua 11ª edição, reuniu milhares de pessoas: 4.555 pesquisadores, professores, estudantes, técnicos, gestores, profissionais e militantes da Saúde, em 118 mesas-redondas, quatro grandes debates e 6.263 apresentações de trabalho, sob o tema Saúde, desenvolvimento e democracia: o desafio do SUS universal. O evento, realizado de 28/7 a 1º/8, na Universidade Federal de Goiás (UFG), em Goiânia, buscou apontar caminhos para a saúde pública e fez duras críticas às medidas conservadoras de combate à crise econômica, como o ajuste fiscal, o avanço do capital sobre o direito à saúde e os cortes na Saúde e na Educação. “Lutaremos contra a PEC 451, por representar um retrocesso em relação às conquistas que tivemos na Constituição de 1988. Temos que mobilizar todas as forças para que não haja a possibilidade de um retrocesso desse tamanho, que favorece interesses econômicos contrários aos interesses da maioria da população brasileira”, discorreu o ex-ministro da Saúde, Arthur Chioro — substituído pelo deputado (PMDB-PI) e médico psiquiatra Marcelo Castro, após reforma ministerial anunciada pela presidente Dilma Rousseff, no dia 2 de outubro. O ex-ministro referiu-se à medida que altera o art. 7º da Constituição, obrigando todos os empregadores brasileiros a garantirem aos seus empregados serviços de assistência à saúde, excetuados os trabalhadores domésticos, afrontando todo o capítulo da seguridade social e a seção da saúde e seus dispositivos.

Chioro recordou seus tempos de estudante de medicina e profissional da Saúde Coletiva, reafirmando o compromisso que a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) tem com o SUS. “Sou profissional de saúde coletiva e docente da área. Ajudei milhares de companheiros no processo de implantação do SUS. Desde o primeiro congresso da Abrasco, quando ainda era estudante de medicina, reconhecemos o papel essencial que essa organização representa na luta pela democracia e pelos direitos sociais e na construção e defesa do SUS”, declarou, lembrando que tal compromisso se expressa, ainda, no tema do congresso.

Resistência

O então presidente da Abrasco, Luis Eugenio Portela de Souza — substituído por Gastão Wagner, professor de Medicina Preventiva e Social da Universidade Estadual de Campinas, eleito até 2018 —, contou que havia a expectativa, há um ano e meio, quando o tema do evento foi definido, de discutir como inserir o SUS em um processo de desenvolvimento econômico e social e de aprofundamento na democracia. “A década anterior, marcada pela melhoria das condições de vida de milhões de brasileiros, nos incitava a apontar os limites e a querer mais desenvolvimento sustentável, superação das desigualdades históricas, democracia participativa e políticas públicas para a saúde. Entretanto, diante do retrocesso apresentado pelo panorama político atual, as discussões mudaram de rumo”, frisou.

Portela fez questão, porém, de ressaltar que a saúde coletiva cresceu e se fortaleceu, produzindo conhecimento, formando profissionais e acumulando experiências sempre com espírito crítico e compromisso social. “Antes da criação do SUS, quem tinha emprego formal pagava a Previdência Social e tinha direito à assistência pelo Inamps [Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social]. Quem não tinha trabalho formal usava o sistema filantrópico ou outras alternativas. O SUS acabou com isso”, recordou, destacando que é preciso barrar os ataques à universalização do SUS, resistir à lógica privatista e reafirmar o direito à saúde como dever do Estado. “Fim dos subsídios aos planos privados. Que os inimigos do povo não ousem tocar nos nossos direitos, pois nós resistiremos”, finalizou. O discurso de Portela orientou a Carta de Goiânia, documento-síntese das discussões e propostas para a Saúde Coletiva no Brasil, apresentada no fim do evento.

Presidente do Conselho Nacional de Saúde, Maria do Socorro de Souza, lembrou outro importante espaço de discussão que acontece este ano, de 1º a 4 de dezembro, e poderá fazer frente a tantos ataques que o SUS vem sofrendo, citando a 15ª Conferência Nacional de Saúde.  “Precisamos afirmar a legitimidade dos sujeitos políticos que aqui estão. Não são apenas pesquisadores, estudiosos e estudantes. São pessoas que pensam a saúde pública brasileira, promovem, formulam, avaliam, monitoram e têm autoridade para ter posicionamentos que ajudem o Brasil a continuar avançando”, defendeu. Para ela, o Brasil presenciava um processo de desenvolvimento, inclusive no campo da saúde, reduzindo a mortalidade materna, a desnutrição, entre tantos outros problemas. Entretanto, hoje, uma onda conservadora que vem, sobretudo, do Congresso Nacional, coloca em risco esses avanços. “Precisamos aproveitar momentos como a 15ª CNS para discutir, por exemplo, a pauta do financiamento e repensar a forma de arrecadação dos recursos para a Saúde”, citou.

Com fortes críticas ao ajuste fiscal, cortes orçamentários anunciados pela presidente Dilma Rousseff nas áreas de saúde e educação, financiamento empresarial de campanha e entrada de capital estrangeiro, a presidente do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde, Ana Maria Costa, observou que a presença dos interesses de mercado sobre a saúde tem resultado no desmonte de direitos e de conquistas históricas em toda a América Latina. Fazer frente a isso, na avaliação do sanitarista Nelson Rodrigues dos Santos, o Nelsão, faz-se necessário elevar o financiamento da saúde e incentivar a criação de projetos que viabilizem sua implementação. Para ele, o subfinanciamento que se originou nos anos 1990 permitiu que o setor de saúde complementar fosse se tornando “substitutivo”, ao mesmo tempo em que foi permitindo a precarização do trabalho.

Subfinanciamento

O médico sanitarista e professor do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Jairnilson Paim, que participou do debate Saúde da população brasileira, chamou atenção para o problema da carga tributária, destacando que, dos cerca de 9% do Produto Interno Bruto (PIB) destinado à saúde, quase 4% provém dos contribuintes. A participação da União, segundo o professor, é menor que a de países que não têm sistemas públicos de Saúde. Ele revelou que a participação da União no financiamento reduziu de 72%, em 1993, para 42,93%, em 2013. “O país cresceu, mas o percentual da riqueza para a Saúde não aumentou”, comparou. 

Ele elencou o que considera ameaças recentes ao SUS, por contrariar, especialmente, o art. 196 da Constituição, que estatui ser a saúde um direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que reduzam o risco de doença e de outros agravos e o acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação. A primeira ameaça diz respeito à rejeição pelo Congresso Nacional do Projeto de Lei de Iniciativa Popular Saúde +10, por meio do qual é proposto que a União aplique, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde, o montante igual ou superior a 10% de suas receitas correntes brutas, fazendo frente ao problema do subfinanciamento da Saúde.

Outras fortes ameaças ao direito à saúde, escancarando as portas para a privatização do setor, são: a abertura de serviços de Saúde ao capital estrangeiro — de que trata a Lei nº 13.019, de 31 de julho de 2014, alterando o art. 199 da Constituição brasileira; a obrigatoriedade de planos de saúde a empregados — tema da PEC nº 451, de 2014, de autoria do deputado e presidente da Casa, Eduardo Cunha, que altera o art. 7º da Constituição, inserindo novo inciso que obriga a todos os empregadores brasileiros a garantirem aos seus empregados serviços de assistência à saúde, excetuados os trabalhadores domésticos; o Projeto de Lei das Terceirizações (nº 4.330/2014), aprovado pela Câmara dos Deputados em 8/4/2015 e encaminhado para votação no Senado — que prevê a contratação de serviços terceirizados para qualquer atividade, desde que a contratada esteja focada em uma atividade específica; o reconhecimento da constitucionalidade das Organizações Sociais (OSs); e o comprometimento do governo com a proposta de Cobertura Universal de Saúde (CUS), adotada pela Organização das Nações Unidas (ONU) e capitaneada por empresas como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Fundação Rockefeller.

Conjuntura da saúde

Não faltou, porém, uma observação mais focal sobre a saúde dos brasileiros. Ainda no debate Saúde da população brasileira, o médico epidemiologista Cesar Victora, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que atua na área da Saúde Materna e Infantil, ressaltou a queda da mortalidade infantil, fazendo menção ao alcance, antes do prazo, da quarta meta dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio da ONU, que era, até 2015, reduzir a mortalidade infantil para 17,9 óbitos por mil nascidos vivos — o índice brasileiro que era de 53,7 mortes, em 1990, passou para 17,7, em 2011.

A mortalidade materna, porém, vive outro panorama, anunciou. O ritmo de queda não é suficiente para que o país alcance até o fim do ano o Objetivo de Desenvolvimento do Milênio neste quesito. A meta estabelecida pela ONU era de uma taxa de 35 mortes por 100 mil nascimentos até 2015. O Brasil, porém, segundo o Ministério da Saúde, registra 62 casos de mortes maternas a cada 100 mil nascimentos. Em 2013, 1.567 mil mulheres morreram no Brasil por complicações ao dar à luz, durante ou após a gestação ou causadas por sua interrupção.

Victora revelou que, em 1990, 30% das mulheres pobres faziam partos em casa. Em 2006, praticamente 100% das mulheres realizavam partos hospitalares, sem entrar no mérito da qualidade da ação. Ele acredita que o alto índice de mortalidade materna tenha relação com uma grande quantidade de prática de aborto ilegal, fato que precisa ser considerado um problema de saúde pública. Segundo ele, a cada quatro partos, um acaba em aborto ilegal. “A cobertura ao parto não é suficiente, além da má qualidade da atenção do pré-natal”, afirmou.

Ele lamentou a ausência de um inquérito de saúde reprodutiva — o último foi realizado em 2006 —, revelando que países vizinhos como a Argentina tem um a cada quatro anos.  Como exemplo, apresentou a cidade de Pelotas (RS), com mais de 300 mil habitantes, onde um estudo de corte sobre o tema é realizado a cada 11 anos. Segundo o epidemiologista, desde 1982, as mães de Pelotas apresentam maior índice de escolaridade, o que pode ter influenciado na redução do número de mães adolescentes e quanto ao fumo na gestação. Tais quedas, porém, são observadas, principalmente, entre as de classe social mais elevada, por terem mais acesso à informação, evidenciando uma grande desigualdade. Victora contou, também, com base nesse estudo, que 47% das mães estão com obesidade ou sobrepeso e, consequentemente, os bebês, que estão nascendo em situações de saúde piores que há 30 anos.

Luta de classes

O Centro de Cultura e Eventos da UFG foi palco do debate Estado democrático e gestão pública de saúde. O professor e pesquisador da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) e integrante do Fórum de Saúde do Rio de Janeiro, André Dantas, abordou conceitos da luta de classes, sob a perspectiva de retomar um debate esquecido e relegado pelas esquerdas ao longo dos últimos anos. Para ele, as táticas e estratégias que a classe trabalhadora vem usando para fazer valer seus interesses têm se apoiado unicamente na disputa da democracia formal. “A concepção que as embasa está na noção de um Estado como máquina, um local físico de poder na qual o mais competente poderia trocar a pele desse Estado e transformá-lo a seu bel prazer”, observou.

A pesquisadora e atual diretora do Instituto de Nutrição da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (INU/Uerj) e integrante do Grupo Temático Alimentação e Nutrição em Saúde Coletiva (GT ANSC/Abrasco), Inês Rugani, falou sobre a relação público-privada e os conflitos que dessa relação decorrem, principalmente no campo da alimentação e da nutrição, fruto das reflexões que faz junto à Frente pela Regulação da Relação Público-Privada em Alimentação e Nutrição. Segundo ela, nem sempre o interesse público implica práticas governamentais.

Em sua análise, a atuação das indústrias e das empresas é muito diversificada, indo de insumos agrícolas a máquinas, da criação de fórmulas alimentares e produtos farmacêuticos a produção e comercialização de alimentos in natura e ultraprocessados. “Ao proceder unicamente a favor de seus interesses comerciais, essas empresas comprometem a segurança alimentar e nutricional da população e a soberania alimentar do país, conformando um sistema alimentar pautado em um modelo concentrador de poder e de renda e altamente dependente de corporações multi e transnacionais”, criticou.

Os princípios da reforma sanitária, dentre eles o fortalecimento da democracia, pautaram a fala do professor titular de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, Gastão Wagner. “Minha tese é que é preciso reinventar a democracia. Não há Estado que consiga representar o interesse público sem reinventar e ampliar os movimentos sociais”, defendeu, lembrando a luta do movimento sanitarista pela garantia ao direito à saúde entre os anos 1970 e 1980. Segundo ele, o movimento não se restringia à área de cuidados, uma vez que defendia uma noção ampliada de saúde. “A reforma sanitária passava por democracia e pela luta política, pela necessidade de radicalizar as formas de participação”, recordou, ressalvando que faltou mudar o Estado brasileiro e melhorar a gestão pública. “O movimento foi bem-sucedido em reformular o modelo assistencial, com foco na atenção básica e equipes multiprofissionais. No entanto, não conseguiu mudar o Estado e melhorar a gestão”, resumiu.

Saúde com Dilma

Desafios e perspectivas da política de Saúde no segundo governo Dilma deu título a um dos mais concorridos debates do Abrascão 2015, em vista da presença do então ministro da saúde Arthur Chioro. Em seu lugar, o médico sanitarista Rogério Carvalho resgatou a organização sistêmica do SUS, começando pelo direito à saúde garantido na Constituição de 1988 e passando pelos conceitos de descentralização e regionalização do sistema, instaurados na Lei Orgânica da Saúde 8.080/90. “É preciso atentar que o Brasil é o único sistema universal de base local. Isso representa uma quantidade de mais de seis mil operadores sistêmicos, sendo 5.565 sistemas municipais de saúde”, contabilizou.

Ele lembrou os investimentos em formação, distribuição e fixação de profissionais, em referência ao Programa Mais Médicos como mola propulsora desse processo. O programa, lançado pela presidente Dilma em 8 de julho de 2013, tendo como foco o provimento de médicos em regiões com dificuldades de atrair esses profissionais, propõe, também, que estudantes de medicina, como parte da sua formação, passem a trabalhar dois anos pelo SUS.

Quanto ao tema específico da mesa, Carvalho defendeu a ampliação do controle social. “A paridade na participação do conselho [a proporção de segmentos representados, conforme a Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, é de 50% de entidades de usuários, 25% de entidades dos trabalhadores de Saúde e 25% de representação de governo, de prestadores de serviços privados conveniados ou sem fins lucrativos] tem sido respeitada, mas é preciso criar novas formas de interação direta do usuário com o SUS”, recomendou.  Para ele, esse seria um dos principais desafios da política de Saúde, conferindo maior legitimidade e voz aos principais atores do SUS, que são os usuários.

Para Luis Eugenio, porém, não é de ampliação da participação que a sociedade mais carece, mas de comprometimento com seus pleitos. Ele lembrou o Movimento Nacional em Defesa da Saúde Pública Saúde+10, que conseguiu 1,8 milhão de assinaturas a favor de um Projeto de Lei de Iniciativa Popular — entregue à Presidência da Câmara dos Deputados no dia 5 de agosto — que assegure o repasse efetivo e integral de 10% das receitas correntes brutas da União para a saúde pública brasileira, alterando, dessa forma, a Lei Complementar nº 141, de 13 de janeiro de 2012. Infelizmente, apesar da mobilização, o Legislativo ainda não atendeu à sociedade. “A falta de financiamento, por exemplo, não decorre de uma falta de participação social. O que acontece é uma barreira dentro do Congresso Nacional’, criticou.

Para o professor da UFG, Elias Rassi Neto, o ponto mais crítico do debate é a organização de um sistema que têm cerca de seis mil operadores. “Após 30 anos de trabalho no SUS, não consigo enxergar no cenário nacional um hospital público que, sem autonomia administrativa, consiga atender com qualidade”, observou, destacando nesse sentido os hospitais municipais que ficam em regiões do interior, em situação de muita carência e dificuldade. “Não acredito em sistematização sem autonomia gerencial e autonomia financeira”, defendeu.

Formação em saúde

O Mais Médicos foi também abordado pelo secretário de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (Sgtes) do Ministério da Saúde, Hêider Aurélio Pinto, na mesa de debate Oportunidades e perspectivas para que o SUS ordene efetivamente a formação em saúde. Ele destacou as três dimensões do programa: o provimento emergencial de profissionais; a ampliação e melhoria da infraestrutura das unidades de saúde; e a expansão da formação voltada para o SUS com qualidade.

Segundo Hêider, mais de 10 mil obras de infraestrutura já foram concluídas e 11 mil estão em execução, beneficiando mais de cinco mil municípios. O secretário destacou, ainda, que o provimento emergencial do programa, somado às equipes de Saúde da Família, implica uma cobertura de 63 milhões de pessoas, em 4.058 municípios e 34 distritos indígenas no país. Deste total, 75% estão localizadas no semiárido do Nordeste, na periferia dos grandes centros urbanos com Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) baixo e em municípios e regiões com população quilombola. “É inegável que há um movimento importante mexendo na estrutura física na Atenção Básica. O Mais Médicos deixou de ser uma proposta e se tornou um programa em funcionamento”, comemorou, revelando, ainda, que a cobertura da Atenção Básica cresceu mais de 10% com a criação do programa,
alcançando 90% da população.

Inclusão com EaD

“Não fazemos educação a distância porque adquirimos tecnologia, mas sim porque  tudo isso está ligado à inclusão”, disse Francisco Eduardo de Campos, professor da Universidade de Medicina da UFMG. Na mesa de debate Educação a Distância (EaD): impactos e perspectivas na saúde, Campos defendeu a educação permanente em saúde, facilitada pela EaD. “Significa buscar formas mistas de educação, sem exclusão e com qualidade”, explicou. Ele revelou que são estimados mais de três milhões de trabalhadores no Brasil carentes de atualizações de alta qualidade, que podem ser realizadas por meio da EaD. “A Universidade Aberta do SUS (UNA-SUS) [criada pelo Ministério da Saúde, em 2010, para atender às necessidades de capacitação e educação permanente dos profissionais de saúde que atuam no sistema público] ofereceu um curso on-line de vacinação contra o HPV que atingiu 20 mil trabalhadores. Se não fosse realizado por meio da EaD, esse número não seria tão expressivo”, contou.

Antonio Ivo de Carvalho, coordenador do Centro de Estudos Estratégicos da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz (CEE/Ensp/Fiocruz), focalizou as inovações tecnológicas como meio de facilitar o campo educativo. Nesse campo, citou a experiência da Ensp, que nos anos 1990, começou a utilizar os recursos da EaD na área da Saúde Coletiva. Ele contou que o objetivo era superar os desafios geográficos de um país com dimensão continental e atingir a um grande número de pessoas. “O processo, porém, passou por inúmeras dificuldades, pois a implantação de um sistema desse nível não é fruto de uma decisão, mas sim do nível em que se encontra o conhecimento das pessoas”, esclareceu. Dificuldades, porém, superados, o primeiro curso de EaD realizado pela Ensp, em 1999, em Gestão em Saúde, aconteceu graças a professores que acreditaram no projeto. “Mesmo sem internet, o curso conseguiu formar mais de dois mil alunos”, recordou Ivo.

A professora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Janete Lima de Castro, fez algumas ponderações sobre o tema, ressaltando que a distância é apenas a forma de organização do ensino. “Há um encantamento sobre as novas tecnologias, mas é preciso considerar o conceito de educação como primeiro plano, onde não existe um único meio de fazer EaD, pois as ferramentas têm que atender às necessidades, podendo apresentar diferentes desenhos, elementos e metodologias”, observou.

Para Janete, a EaD tem um grande potencial de ampliar o acesso dos trabalhadores da saúde aos processos de educação permanente, pois atinge pessoas em lugares distintos e não exige deslocamentos. Mas, ressalva que o fator presencial na EaD é primordial.  “Se o aluno não tiver um bom tutor, ele desiste. Por isso os encontros presenciais são importantes”, defendeu.

Ela contou que, em 2013, no Nordeste, foi iniciada a Especialização em Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, na modalidade de EaD. Fruto de uma parceria entre a UFRN e a Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (Sgtes/MS), o curso contou com 750 vagas e formou 605 alunos. Segundo Janete, a pequena evasão encontra explicação na atuação do tutor, na concepção pedagógica do curso, na existência de um livro que estabelece um bom diálogo com a plataforma virtual e em um ambiente virtual de aprendizagem mediado por uma plataforma de fácil acesso e navegação.

Alexandre Figueiredo, diretor do Departamento de Gestão da Educação na Saúde (Deges/Sgtes/MS), abordou uma concepção que foi além do conceito de EaD, focalizando o uso das tecnologias da comunicação e da informação na formação para o SUS, frente a demandas da Saúde, como o aumento das doenças crônicas não transmissíveis, o envelhecimento da população, a fragmentação do cuidado e as mudanças socioeconômicas. “É preciso identificar as necessidades de saúde dos usuários e pensar o SUS como espaço de aprendizado”, explicou.

Segundo Alexandre, as tecnologias de comunicação e informação implicam ambientes virtuais de aprendizagem adaptados, planejamento dos módulos educacionais, certificação, redes colaborativas de aprendizagem, educação em saúde para a população e avaliação de impacto, conforme as necessidades que devem ser apontadas por usuários e trabalhadores do SUS.

 

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