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Os caminhos trilhados no cuidado de usuários de drogas

Projeto revela-se ousado ao integrar as escolas técnicas do SUS em um só propósito.

Flavia Lima
 

Compartilhar os resultados do processo de formação em saúde mental, com foco no cuidado de usuários de álcool, crack e outras drogas, dos 292.196 agentes comunitários de saúde e auxiliares e técnicos em enfermagem de todo o Brasil. Esse foi o objetivo da Oficina Caminhos do Cuidado: Trajetórias, realizada de 15 a 18 de setembro, em Brasília, com a participação dos representantes das 40 instituições que integram a Rede de Escolas Técnicas do SUS (RET-SUS) e do Ministério da Saúde. O evento abordou a centralidade do aluno na construção do projeto pedagógico, o fortalecimento das escolas técnicas do SUS (ETSUS), cuja participação mereceu destaque, e a oportunidade de experimentar novos dispositivos de educação permanente. “A expertise aproveitada para realizarmos um projeto dessa magnitude, o aprendizado institucional, um conjunto de atores nacionais que construíram uma governança importante, os estados, os municípios e as escolas técnicas foram fundamentais para construirmos um processo pedagógico que colocou o estudante na centralidade do trabalho”, resumiu o secretário de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (Sgtes/MS), Hêider Aurélio Pinto.

Em sua observação, o projeto — coordenado pelo Grupo Hospitalar Conceição (GHC), de Porto Alegre, e pelo Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), por meio de convênio com o Departamento de Gestão da Educação na Saúde (Deges/Sgtes/MS) — destacou-se pela mobilização da RET-SUS e possibilitou a criação de novos processos de trabalho para as escolas. “Demos um passo importante ao usar a Rede para integrar e mobilizar processos formativos”, afirmou o secretário.

Diretora superintendente do GHC, Sandra Maria Sales Fagundes lembrou que o projeto implicou quebra de paradigmas e preconceitos e produção de valores sobre o cuidado em saúde mental. Para Alexandre Medeiros, diretor do Departamento de Gestão da Educação na Saúde (Deges/Sgtes/MS), o projeto foi bastante ousado, o que permite pensar que novos caminhos do cuidado se quer seguir.

O protagonismo das ETSUS no processo de formação dos trabalhadores da saúde, bem como a inclusão dos municípios no projeto, por meio da pactuação, foram destacados pela representante do Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), Márcia Pinheiro. “A inclusão dos municípios nesta empreitada foi essencial. O alcance dessa meta não deixa dúvidas de que é preciso que a gestão municipal esteja sempre envolvida”, disse. Para o vice-presidente de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fundação Oswaldo Cruz, Valcler Fernandes, o sucesso do trabalho foi resultado da união de instituições e pessoas comprometidas com o Sistema Único de Saúde (SUS).  “Só dá certo assim: juntando instituições, ideias e pessoas”, afirmou. Ele elogiou a participação da RET-SUS nesse processo. “Ela é uma potência e temos que explorar isso”, destacou. Valcler observou, ainda, que o projeto ousou ao enfrentar os temas da intolerância, do preconceito e da exclusão, além de focalizar o aspecto técnico da formação profissional em saúde.

Ainda como resultado desse trabalho, foi lançado o Observatório Caminhos do Cuidado. Trata-se de uma plataforma virtual para a troca de experiências e produção coletiva de conhecimento, com o suporte tecnológico necessário para permitir a interação entre os envolvidos e todos os estados. A ideia com isso é preservar e registrar o que foi feito e disponibilizar todo o conhecimento produzido ao longo da formação.

Dimensões do trabalho

Coordenador de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do Ministério da Saúde, o médico psiquiatra Roberto Tykanori falou no primeiro dia de encontro, reforçando o conceito de território e sua ligação com a construção das políticas de Saúde Mental no país, tratado durante as etapas formativas. Para ele, a formação em Saúde Mental é uma ótima oportunidade de preparar os profissionais para lidar com o problema das drogas, questão que ainda precisa de investimento técnico. Afinal, segundo Tykanori, os principais problemas de saúde recaem sobre a atenção básica, especialmente sobre a Estratégia Saúde da Família (ESF) e, consequentemente, o agente comunitário de saúde. O coordenador problematizou a questão, explicando que a estratégia fundamental de saúde mental na atenção básica é desenvolver um modo de compreender o sofrimento alheio e de ajudar a resolver o problema.

Os consultores do projeto Ruy Casale e Edelves Rodrigues, ambos da Coordenação Executiva do Caminhos do Cuidado, chamaram atenção para os números do projeto: foram formados 292.196 alunos, superando a meta prevista de 290.197, quando o projeto foi lançado, em maio de 2013. Foram, 117.170 formados no Nordeste, 83.062 no Sudeste, 36.965 no Sul, 33.496 no Norte e 21.503 no Centro-Oeste. As primeiras turmas foram realizadas nos estados do Acre, Pernambuco, Paraná, Rio Grande do Sul, São Paulo e Distrito Federal. “A formação proposta pelo Caminhos do Cuidado inovou pela facilitação de processos de educação permanente e metodologias ativas e, ainda, com estratégias que possibilitaram aos atores da atenção básica trabalharem em conjunto com a saúde mental, acolhendo e cuidando do usuário e seus familiares”, observou Casale.

A iniciativa se deu em três etapas formativas. A primeira referiu-se à formação dos orientadores de aprendizagem, que foram capacitados por meio de uma oficina de formação pedagógica com 24 horas de aula. A segunda foi a formação dos tutores — cerca de 1.400 —, por meio de curso com 40 horas de formação presencial e 80 horas de Educação a Distância (EaD). Por fim, os tutores formaram os agentes comunitários de saúde e auxiliares e técnicos em enfermagem da Atenção Básica, por meio de uma capacitação de 60 horas, sendo 40 horas presenciais e 20 horas de dispersão. Coube, especialmente, às escolas integrantes da RET-SUS a última etapa de formação.

De acordo com a consultora Stefanie Kulpa, o projeto foi realizado em 100% das regiões de saúde e em mais de 90% dos municípios. No que se referiu ao processo de articulação, com base em informações repassadas pelos estados, ela revelou que 83% dos estados estabeleceram uma interface com os diferentes atores envolvidos no processo de formação a partir dos colegiados de gestores e que 100% atuaram em parceira com as ETSUS, secretarias municipais de saúde, secretarias estaduais de saúde e Ministério da Saúde.

Panorama exitoso

Stefanie revelou, por um lado, que as potencialidades do projeto foram o material pedagógico, a metodologia das oficinas de capacitação, a equipe matricial e os dispositivos de educação permanente pensados pelos estados, como mostras de práticas exitosas, rodas de conversa e oficinas. O trabalho, segundo ela, encontrou êxito na capilaridade do debate sobre o cuidado aos usuários de drogas, favorecendo a identificac?a?o de ac?o?es de sau?de mental realizadas no território e dialogando com questo?es do dia a dia do trabalho, bem como na qualificação do trabalho dos agentes comunitários de saúde e dos auxiliares e técnicos de Enfermagem, ampliando sua atuação no cuidado em saúde mental.

Dentre as fragilidades apontadas pela consultora, por outro lado, destacaram-se a fragilidade na formação de orientadores e tutores, a dificuldade em selecionar tutores com perfil adequado para atender os territórios, a pouca interação de orientadores com tutores e equipe regional e pouca aproximação da equipe nacional pedagógica com o trabalho realizado nos estados.

Selecionados por currículo, os orientadores, em geral, eram profissionais de nível superior com pós-graduação em áreas como Saúde Mental, Saúde Coletiva, Saúde Pública, Atenção Básica, Educação ou Ciências Sociais. Os tutores, por sua vez, eram profissionais com nível superior em Saúde e experiência de, pelo menos, um ano em Atenção Básica ou Saúde Mental. A formação desse grupo foi dividida em cinco etapas e fez uso da chamada metodologia de aprendizagem ativa, por meio da qual o tutor ativa o processo e o material pedagógico.

Sugestões para o aprimoramento do projeto foram, também, apontadas pela consultora, com destaque para formac?a?o de toda a equipe da Estratégia Saúde da Família (ESF), ampliação do diálogo entre as diferentes instâncias e equipes do projeto e ampliação da participação das ETSUS nas diferentes etapas do trabalho.

Nova representação

Já que a participação das escolas foi ponto focal do trabalho, o último dia do evento foi dedicado ao anúncio dos novos representantes regionais da RET-SUS, realizado pelo coordenador-geral de Ações Técnicas em Educação na Saúde do Deges/Sgtes/MS e da Rede, Aldiney José Doreto. A representante eleita da Região Norte foi Angelita de Almeida, diretora do Centro de Educação Técnico-Profissional na Área de Saúde de Rondônia (Cetas-RO). A suplente foi Laudecy Soares, da Escola Tocantinense do Sistema Único de Saúde (ETSUS-TO). Da Região Nordeste, Jorge Luiz Castro, diretor do Centro de Formação de Pessoal para os Serviços de Saúde Dr. Manoel da Costa Souza (Cefope-RN). O suplente foi Alessandro Soledade Reis, da Escola Técnica de Saúde do SUS em Sergipe (ETSUS-SE).

A diretora da Escola Técnica de Saúde de Brasília (Etesb), Ena Galvão, foi escolhida para representar a Região Centro-Oeste. A suplente foi Evelyn Cafure, da Escola Técnica do SUS Profª Ena de Araújo Galvão (ETSUS-MS). Na Região Sul, foi reeleita a diretora da Escola Técnica do Sistema Único de Saúde Blumenau, Claudia Lange. A suplente foi Arlete Spoladore, do Centro Formador de RH Caetano Munhoz da Rocha (Cefor-RH-PR). A representante da Região Sudeste foi Laura Santucci, diretora da Escola Municipal de Saúde (EMS-SP). A suplente, Roseni Sena, da Escola de Saúde Pública do Estado de Minas Gerais (ESP-MG).

Os novos representantes integram a Comissão Geral de Coordenação da RET-SUS, uma instância deliberativa e representativa da Rede. Além dos cinco dirigentes de escolas — um de cada região brasileira —, fazem parte desse grupo um representante do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass), um do Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) e um da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) no Brasil. A Comissão é presidida pelo titular da Coordenação-Geral de Ações Técnicas em Educação na Saúde do Deges/Sgtes/MS.
 

BOX

Mais investimento em Saúde Mental

O Ministério da Saúde (MS) divulgou, em outubro, investimento de cerca de R$ 36,4 milhões na Rede de Atenção Psicossocial (Raps). A ideia é promover a melhoria e ampliação dos serviços ofertados no SUS, na área de saúde mental. As verbas serão destinadas aos estados do Amazonas, Bahia, Ceará, Goiás, Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Pernambuco, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rondônia, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Sergipe, São Paulo e Tocantins.

Como os recursos, segundo a portaria do MS n° 1647/20, os estados serão contemplados com a habilitação de 76 centros de atenção psicossocial (CAPs) e 46 serviços residenciais terapêuticos (STRs). Atualmente, 2.241 CAPs estão em funcionamento, o que significa crescimento de 8,4% se comparado a 2013, quando havia 2.067 centros. Desde 2011, foram criados 878 leitos de saúde mental em hospitais gerais, em articulação com os demais componentes da Raps, para garantir a continuidade do cuidado. Além dos CAPs, 61 unidades de acolhimento (UA) estão em atividade. Essas unidades foram criadas para atender usuários de crack, álcool e outras drogas, em situação de vulnerabilidade social e familiar.
 

INFOGRÁFICO

Caminhos do Cuidado em números
 

Região Nordeste (117.170 vagas ofertadas)

Alagoas – 6.838

Bahia – 29.549

Ceará – 17.360

Maranhão – 17.879

Paraíba – 9.111

Pernambuco – 17.508

Piauí – 8.219

Rio Grande do Norte – 6.259

Sergipe – 4.447

 

Região Sudeste (83.062 vagas ofertadas)

Espírito Santo – 5.901

Minas Gerais – 34.357

Rio de Janeiro – 16.292

São Paulo – 26.512

 

Região Sul (36.965 vagas ofertadas)

Paraná – 14.249

Rio Grande do Sul – 11.303

Santa Catarina – 11.413

 

Região Norte (33.496 vagas ofertadas)

Acre – 2.231

Amapá – 1.382

Amazonas – 6.563,

Pará – 15.147

Rondônia – 3.204

Roraima – 785

Tocantins – 4.184

 

Região Centro-Oeste (21.503 vagas ofertadas)

Distrito Federal – 1.074

Goiás – 9.957

Mato Grosso – 5.522

Mato Grosso do Sul – 4.950

 

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