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Ronald Ferreira dos Santos

‘Eu encaro essa função como uma coordenação’

Ana Paula Evangelista
 

“A 15ª Conferência Nacional de Saúde foi extremamente vitoriosa, pois conseguiu colocar no centro do debate a saúde como direito de cidadania, e não como mercadoria”. A análise é de Ronald Ferreira dos Santos, presidente eleito para o triênio 2016-2019 do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Em entrevista à Revista RET-SUS, ele analisa o encontro realizado de 1º a 4 de dezembro de 2015 e que reuniu, em meio a uma enorme crise política e econômica, aproximadamente 4.600 pessoas, entre 3.260 representantes de gestores, prestadores de serviço, trabalhadores da saúde e usuários. A conferência, na ocasião, foi atravessada por atos de apoio ao governo, a despeito de algumas críticas, diante do anúncio da abertura de impeachment da presidente da República Dilma Rousseff.

Farmacêutico do Centro de Informações Toxicológicas de Santa Catarina e, durante anos, integrante da mesa diretora do CNS, como coordenador do grupo de trabalho sobre financiamento da saúde, Ronald observa a participação dos movimentos sociais na conferência bastante exitosa. “Uma conferência que não tivesse a participação social seria débil e com pouca capacidade de escuta”, atentou, falando, também, sobre suas perspectivas para a gestão do CNS. “Hoje estou como presidente de um órgão colegiado, que representa os vários segmentos sociais”, garantiu o presidente do CNS e, também, da Federação Nacional dos Farmacêuticos (Fenafar).
 

Que balanço você faz da 15ª Conferência Nacional de Saúde?

A 15ª Conferência Nacional de Saúde foi extremamente vitoriosa, uma vez que conseguiu colocar no centro do debate uma questão bastante disputada, se a saúde é um direito de cidadania ou é mais uma mercadoria. A 15ª conseguiu provocar uma agenda em torno de questões caras à saúde como direito. A luta pelo direito à saúde foi materializada no encontro, por exemplo, pela realização de uma grande manifestação na rua [a Marcha em Defesa do SUS, que reuniu milhares de pessoas na tarde do dia 1º de dezembro, antecedendo a abertura da conferência]. Ainda do ponto de vista da mobilização, envolveu quase cinco mil municípios e mais de um milhão de participantes em todo país.

Que propostas aprovadas na 15ª CNS você destacaria?

A reafirmação da saúde como direito. Essa proposta foi percentualmente a que recebeu a maior aprovação — acima dos 90% —, o que nos leva a concluir a necessidade de reafirmação dos princípios da integralidade e da universalidade, bem como de responsabilidade do Estado. O SUS estava precisando desse movimento, pois vivemos um momento de resistência, de retiradas de direitos, de ofensiva do mercado e do capital.

Como você observou a participação dos movimentos sociais na conferência? E como avalia o apoio dado ao governo durante a 15ª CNS, entendendo a missão de uma conferência nacional de saúde?

Um fato que contribuiu bastante para a grande mobilização social foi a 4ª Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador [realizada em dezembro de 2014, esta conferência foi considerada na ocasião uma etapa de discussão da 15ª Conferência Nacional de Saúde]. Além disso, tivemos as plenárias nacionais, regionais e as conferências livres, que contribuíram bastante para o processo de participação. Temos a clareza que uma conferência que não tivesse a participação social seria débil e com pouca capacidade de escuta. Quanto ao apoio dado ao governo, esse se fez necessário. Receber no espaço institucional um chefe de Estado, trazendo um conjunto de compromissos em defesa do SUS, foi extremamente positivo.

Que avaliação você faz sobre o controle social do SUS?

É um dos mais poderosos instrumentos que faz com que a vontade popular e o direito à saúde consigam avançar e impeçam retrocessos. Nós somos uma rede de mais de cinco mil conselhos municipais e mais de cem mil conselheiros de saúde. Esses espaços representam as diferentes organizações do povo. Ou seja, os conselhos de saúde são espaços para sujeitos coletivos se expressarem, não de indivíduos.  O grande desafio é que a participação dos conselhos torne-se instrumento para que esses sujeitos coletivos consigam se fortalecer. À medida que isso acontece, a capacidade de intervir e o poder da instituição serão cada vez mais ampliados. Não podemos esquecer que conquistamos com essa democracia participativa o poder deliberativo.

O que é preciso fazer para garantir as conquistas?

Os desafios são do tamanho da crise que o país vive. Uma das questões que estiveram no cerne da 15ª Conferência Nacional de Saúde foi a discussão do estado democrático de direito. Estamos assistindo um avanço brutal, em todos os cantos do mundo, de um pensamento político que se opõe à saúde enquanto direito. A ordem é a lógica neoliberal, que avança com muita força e ameaça os direitos sociais. Provocar, porém, um debate desvinculado desse cenário é também um erro. Por isso, há a necessidade de fazer uma discussão politizada, que leve em conta as filas, os pacientes nos corredores das emergências, mas que considere, também, os interesses na destinação dos recursos.

Que avaliação você faz do SUS?

O SUS é o maior sistema de saúde pública do mundo, mas que sofre um processo grave de asfixia financeira. Podemos ter o melhor projeto, mas, sem recursos materiais e financeiros para sua execução, ele será inviabilizado. Há a possibilidade de termos menos recursos financeiros para a saúde em 2016 em relação ao montante de 2014. Isso significa mais filas, mais ambulâncias quebradas, menos equipes de saúde da família etc. O enfrentamento desse problema passa pelo Movimento em Defesa da Saúde Pública Saúde +10 — ou seja, pela aplicação de pelo menos 10% das receitas correntes brutas da União na Saúde —, pela taxação das grandes fortunas e pela mudança da política macroeconômica.

Quais são as expectativas desta gestão do CNS?

A minha história de militância sempre foi um espaço de construção coletiva. Eu presido a Fenafar e já presidi sindicato. Tenho uma trajetória no movimento popular e na organização sindical. Hoje estou como presidente de um órgão colegiado, que representa os vários segmentos sociais. Minha tarefa principal será dar conta das deliberações da 15ª Conferência Nacional de Saúde, como também do CNS, e dividir essa responsabilidade com os conselheiros, em especial com os outros sete conselheiros que foram eleitos comigo para compor a mesa diretora. Eu encaro essa função como uma coordenação.

 

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