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15/04/2016 Versão para impressãoEnviar por email

Debates atuais para uma educação emancipadora abrem o ano da EPSJV

A EPSJV abriu o ano letivo de 2016 com reflexões sobre as urgências da juventude e a construção de uma educação emancipadora. Destaque, também, para o lançamento do novo portal da escola, conjugando conteúdos institucionais, jornalísticos e serviços à população.

No Dia Mundial da Saúde, comemorado em 7 de abril, a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio da Fundação Oswaldo Cruz (EPSJV/Fiocruz) abriu seu ano letivo com reflexões sobre as urgências da juventude e a construção de uma educação emancipadora. Os debates, realizados nos dias 7 e 8 de abril, reuniram alunos, professores e diretores da unidade, além de representantes da Fiocruz. “Precisamos registrar que a Fiocruz é uma instituição da área da saúde, que luta por uma saúde pública inclusiva e emancipadora, que busca transformar, tendo a saúde como um instrumento central das relações sociais”, frisou o diretor da instituição, Paulo César de Castro Ribeiro, lembrando que foi aluno da primeira turma do curso técnico integrado ao ensino médio da escola, em 1988. “Somos uma escola que luta pelo fortalecimento de um SUS público e de qualidade, que acolhe e cuida de cada estudante que aqui chega”, resumiu a vice-diretora de Ensino e Informação, Páulea Zaquini.

A abertura do ano destacou-se, ainda, pelo lançamento do novo portal da EPSJV. Conjugando conteúdos institucionais, jornalísticos e serviços à população, o espaço foi desenvolvido em software livre, segundo as mais atualizadas tecnologias, facilitando a navegação em dispositivos móveis – como smartphones e tablets – e o compartilhamento de conteúdos, incluindo o WhatsApp.  “Tudo isso sem abandonar os princípios da unidade, já que tudo precisa ser público, ter livre acesso e transparência para a sociedade”, ressaltou o coordenador de Comunicação, Divulgação e Eventos da EPSJV, Marcelo Paixão.

Além de ter acessibilidade para deficientes — com ferramentas de leitor de tela de alto contraste —, o site segue os princípios da usabilidade, possibilitando uma navegação fácil e intuitiva para o usuário, e trabalha de forma integrada com os sistemas de informação, capturando informações em bancos de dados internos e externos, como o cadastro de pesquisas do CNPq. “Essa é a grande novidade, principalmente entre as estratégias de comunicação das instituições públicas”, anunciou Adonai Diófanes, que faz parte da equipe de desenvolvedores do portal.

 

Juventude à frente

Urgências da juventude: emancipação de todos deu título à primeira atividade do evento, abordando os temas do feminismo, dos movimentos estudantis e da participação política, a partir dos olhares dos jovens Wesley Teixeira, do Movimento RUA – Juventude Anticapitalista, Guilherme Braga, da Rede Meu Rio, e Maria Inês Lopa, do Grêmio Estudantil do Colégio Pedro II. “Os alunos sofreram com tirania e repressão por parte do governo. Estudantes foram mortos, muitos desapareceram. Hoje, o movimento estudantil do Colégio Pedro II é bem forte e o Grêmio interfere em muitas coisas, movimentando toda uma unidade”, lembrou Maria Inês, em alusão ao movimento estudantil no contexto da ditadura militar. A estudante, que também integra a comissão de mulheres do colégio, discorreu sobre o tema do feminismo. “Nosso grupo se reúne uma vez por semana em torno do movimento feminista e dos direitos das mulheres”, revelou, atentando para a importância da informação na luta pela igualdade de direitos e pelo “empoderamento” feminino. “Não deixem aquele cara que passou na rua falar obscenidades. Reajam. É perigoso, sim. Sempre vai ser. Mas, ainda mais perigoso é não reagir. Não será apenas aquele o único assédio”, orientou.

A reflexão sobre a participação política ficou a cargo de Wesley Teixeira, que destacou a ocupação do Colégio Estadual Irineu Marinho, localizado na Vila Centenário, em Duque de Caxias, Baixada Fluminense. A escola, ocupada pelos estudantes no dia 6 de março, em reivindicação por melhorias na estrutura física do colégio, pelo fim da superlotação das turmas e por segurança, integra uma forte mobilização e pressão estudantil contra os desmontes que o governo estadual promove na educação pública — até o dia 13 de abril, já eram 40 unidades ocupadas —, a exemplo do movimento de ocupação das escolas de São Paulo.

Para ele, a juventude é de fundamental importância para qualquer país, pois é o grupo que renova e questiona a política. “Passamos por um movimento de muita desesperança e apatia no contexto da participação política. Muita gente perdeu a fé, depois de anos apostando em projetos políticos que não avançaram”, avaliou. Ele ponderou que a juventude atual descobriu que lutar faz sentido e é urgente. “Sentimos-nos fortalecidos, mesmo com toda a crise de representação, quando observamos que, depois que as escolas de São Paulo foram ocupadas pelos estudantes, o governador [Geraldo Alckmin] teve que retroceder”, recordou, defendendo maior investimento nos jovens.

Guilherme finalizou a mesa de debate, abordando a atuação do movimento estudantil nos dias atuais. “Nunca vi tanta participação e tanta gente se colocando. Isso traz uma necessidade de espaço de debate. É preciso não só dizer, mas também escutar o que o outro tem a dizer. E o movimento estudantil está no centro disso, nessa necessidade de amadurecer e escutar ideias deiversas”, resumiu.

 

Homenagem legítima

Um debate sobre os caminhos da politecnia entre os professores José Rodrigues, da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense (UFF), e Paulo Sérgio Tumolo, do Centro de Ciências da Educação e do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), esteve no centro do segundo dia de atividades da abertura do ano letivo da EPSJV. A mesa redonda Debates atuais para uma educação emancipadora foi, porém, precedida de uma legítima homenagem aos militantes do MST, assassinados um dia antes, em 7 de abril, no Paraná. Num auditório decorado com quadros, imagens e outros objetos do Movimento, trabalhadores da EPSJV lembraram a emboscada que atacou, feriu e matou trabalhadores no acampamento Dom Tomás Balduíno, no município de Quedas do Iguaçu, região central do Paraná, onde, entre as mais de 1,5 mil famílias, vivem e trabalham ex-estudantes do curso Técnico de Meio Ambiente em Saúde da escola, voltado para a população do campo. Segundo o MST, o ataque foi uma emboscada promovida pela Polícia Militar junto com seguranças da empresa Araupel, levando ao assassinato dos trabalhadores rurais Vilmar Bordim, de 44 anos, e Leomar Bhorbak, de 25 anos, apesar de as terras onde fica o acampamento já terem sido consideradas públicas pela Justiça Federal, com previsão de destino à reforma agrária.

Para o pesquisador André Campos Búrigo, do Laboratório de Educação Profissional em Vigilância em Saúde (Lavsa) da EPSJV, o caso não foi um fato isolado. Segundo ele, o ataque faz parte de uma escalada de violência e repressão aos trabalhadores do campo que, entre outras formas, se expressou também nos últimos dias na retenção de Frei Sergio, do Movimento dos Pequenos Agricultores, e na prisão do Cacique Babau, liderança da resistência do povo Tupinambá. "Atacar o MST é atacar a democracia”, descreveu Búrigo.  Os trabalhadores da EPSJV lembraram, ainda, uma série de incursões policiais que resultou, no Rio de Janeiro, na mesma semana, em cinco pessoas mortas em Acari e quatro em Manguinhos, complexo de favelas na região onde está localizada a Fiocruz. Para todos os trabalhadores mortos, da cidade e do campo, o auditório da escola gritou: “Presente!”.

 

Educação emancipadora

Mediado pela vice-diretora de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico da EPSJV, Marcela Pronko, José Rodrigues discorreu sobre o tema Por um programa de transição para a educação – em defesa da concepção marxista de formação politécnia, título do seu texto que está no livro Caminhos da politecnia: 30 anos da EPSJV, lançado no evento. Dividido em quatro seções — A educação e a sociedade de classes atual; A educação politécnica no debate brasileiro; A educação segundo Karl Marx; e Por um programa de transição para a educação — o texto tem a pretensão de defender a ideia da necessidade urgente de elaboração de um programa de transição para a educação, tomando o pensamento pedagógico de Karl Marx como seu núcleo central. “A educação é atravessada pela questão da classe social. Isto é, nesse sentido, a escola é sempre palco de uma luta de classes”, sublinhou o professor.

Rodrigues lembrou que a burguesia, desde a revolução industrial inglesa, luta para construir uma escola que sirva aos seus interesses. “A grosso modo, pode-se afirmar que caberia ao sistema escolar duas funções: a formação política dos educandos, segundo a norma vigente; e a função de esconder a classe social”, destacou. Outro aspecto importante, segundo o professor da UFF, é a formação para o trabalho. “Mas não qualquer trabalho. E, sim, o trabalho que produz mediato ou imediatamente mais valor e, portanto, exploração”, frisou, lembrando que é neste contexto de luta por redemocratização, na década de 1980, que a noção de politecnia emerge. A concepção de educação politécnica é traduzida por Demerval Saviani e Gaudêncio Frigotto, cujas referências estão em Mário Manacorda, representando uma profunda ruptura com o projeto de qualificação profissional e, fundamentalmente, escreveu Rodrigues, “com o projeto de formação humana posto pela sociedade burguesa”.

O professor do UFSC, Paulo Tumolo, com base no texto Base teórico-políticas para a discussão da educação da perspectiva da classe trabalhadora, presente no mesmo livro, discorreu sobre a existência como ser humano. Ele garantiu que todas as necessidades humanas são básicas. “Não existe divisão clássica. É tão básico eu estar diante de uma obra de qualquer artista e usufruir aquilo, quanto é básico eu comer. Portanto, as necessidades humanas não podem se resumir às necessidades meramente animais”, explicou.

Entre as necessidades humanas imediatas, o professor citou o alimento, a água, o vestuário, a educação e o transporte. “Os meios de subsistência são produzidos por intermédio do nosso trabalho. Desta maneira, satisfazemos nossa necessidade e vivemos como seres humanos”, defendeu. Tumolo explicou, também, o que são meios de produção que satisfazem as necessidades mediatas do homem. “É tudo que intermedia a minha relação com a natureza e, por meio deles, consigo produzir os meios de subsistência”, disse. Segundo o professor, os meios de produção resultam do nosso trabalho. “O que nos criou humano, efetivamente, foi o trabalho”, frisou, garantindo que é pelo trabalho que o homem se qualifica.

 

Produção da EPSJV

Além do livro Caminhos da politecnia: 30 anos da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, que traz os artigos inéditos de Rodrigues e Tumolo, além da reedição de documentos que nortearam a concepção de educação da EPSJV, foi lançada a publicação Avaliação de Processo de Cooperação Técnica Internacional entre Brasil e Argentina na Formação de Trabalhadores Técnicos em Saúde, de Anakeila Stauffer, Daiana Chagas, Helifrancis Ruela e Geandro Pinheiro. Este segundo livro faz parte da série Boas Práticas da Gestão dos Termos de Cooperação no Contexto da Cooperação Técnica da Opas/OMS. A publicação apresenta o processo e os resultados da avaliação da ação de cooperação técnica desenvolvida pela EPSJV no escopo do Plano de malhoria da Qualidade de Instituições Formadoras de Técnicos em Saúde (do espanhol, Plan de Mejora de la Calidad de Instituciones Formadoras de Técnicos em Salud), dos Ministérios Nacionais de Educação e de Saúde da Argentina.

 

Por Flavia Lima, repórter da Secretaria de Comunicação da EPSJV

 

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