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09/06/2016 Versão para impressãoEnviar por email

Juntos na luta contra portarias que retiram a obrigatoriedade dos ACS nas equipes

Em audiência pública na Câmara dos Deputados, agentes comunitários de saúde e de endemias fizeram pressão pela revogação das portarias 958 e 959. A categoria conseguiu o apoio majoritário dos deputados federais. 

Não existe saúde preventiva no SUS sem os agentes comunitários de saúde. A ideia esteve no centro da audiência pública, realizada no Auditório Nereu Ramos, na Câmara dos Deputados, nesta quinta-feira (9/6), para discutir as portarias 958 e 959, publicadas pelo Ministério da Saúde, no dia 10 de maio, pelo ministro interino à época, José Agenor Álvares. As normas alteram a Política Nacional de Atenção Básica, retirando a obrigatoriedade de existir o agente comunitário de saúde (ACS) nas equipes de saúde da família e apresentando a possibilidade de contratação de técnicos de enfermagem em substituição a este profissional, cujos direitos foram arduamente conquistados nos últimos anos. A inserção do técnico em enfermagem no lugar do ACS e do agente comunitário de endemias (ACEs) surge sob o argumento, segundo o texto oficial, de aumentar a capacidade clínica na Unidade Básica de Saúde e o cuidado no domicílio, fortalecendo a continuidade da relação clínica na construção de vínculo e responsabilização, bem como ampliar a resolutividade da Atenção Básica. 

"Revogue as portarias", gritavam unidos os ACS e ACE em um auditório lotado, com apoio majoritário dos deputados da Casa Parlamentar. "Quem mais precisa do agente de endemias e comunitário de saúde são as famílias carentes do Brasil. Essa é uma luta de cada um de nós. É claro que não queremos travar uma guerra entre as categorias profissionais, mas é preciso reconhecer a importância dos agentes na atenção à saúde da população e, por isso, precisamos de uma solução definitiva", resumiu a deputada Conceição Sampaio (PP-AM), presidente da Comissão da Seguridade Social e Família (CSSF), ao abrir a reunião. 

Autor do requerimento de audiência, o deputado Odorico Monteiro (Pros-CE) lembrou os primeiros agentes comunitários de saúde do Ceará, em 1986, e de toda a trajetória dessa categoria que contribui diretamente para a redução da mortalidade infantil, da desnutrição e da cobertura vacinal. Odorico destacou as conquistas do grupo. Segundo ele, a categoria profissional é a única que em 26 anos produziu duas emendas constitucionais, a EC 51, de 14 de fevereiro de 2006, que trata da admissão dos ACS e ACE por meio de processo seletivo público, e a PEC 323, de 2009, que criou o Piso Nacional dos ACS e ACE. 

Revogação já 

Unidos, a categoria conseguiu o apoio majoritário dos deputados federais. Presente à audiência pública, o deputado Mandetta (DEM-MS) informou que tramita na Casa parlamentar os projetos de Decreto Legislativo nº PDC 396 e 397, sustando as portarias 958 e 959, respectivamente. Para que os projetos sejam votados na Câmara dos Deputados, com urgência, precisam da assinatura de todos os líderes de partido. De acordo com o deputado Valtenir Pereira (PMDB-MT), os projetos já foram assinados pelos líderes do PR, PSDB, DEM, Rede Solidariedade, PMB, PPS, PP, PCdoB, Pros, PSB, PDT e PT, faltando outros com quem não tinham conseguido falar e esperando recolher todas as assinaturas até terça-feira, 14 de junho. 

Os deputados frisaram que a revogação será feita seja pelo ministro da saúde, Ricardo Barros, ou pelo próprio Congresso. O deputado Jorge Solla (PT-BA) observou que o caminho mais rápido e menos constrangedor é pelo Ministério da Saúde. "Que não precisemos voltar aqui na Câmara na próxima semana para aprovarmos a revogação das portarias. Não tenho dúvida que essa luta já está assegurada, seja o ministério revogando, seja a Câmara dos Deputados", garantiu, lembrando ainda que o SUS precisa da mobilização de todos os profissionais de saúde. "O SUS nunca foi tão ameaçado como agora. Pela primeira vez, ao invés do ministro da saúde pedir mais recursos para a saúde, fala que o SUS não cabe no orçamento", sublinhou, lembrando, porém, que a política de saúde pública é a única que faz tanto com tão pouco e, ainda assim, querem cortar os gastos da área. Solla aproveitou para criticar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 87/2015, aprovada em segundo turno pela Câmara dos Deputados, prorrogando a Desvinculação das Receitas da União (DRU) até 2023 e ampliando de 20% para 30% o percentual a ser desvinculado. Isso significa que, caso seja aprovada, também, pelo Senado, o governo poderá destinar para onde quiser 30% das contribuições sociais, que deveriam ir para a Seguridade Social, onde estão reunidas as áreas da saúde, assistência e previdência. "Precisamos nos mobilizar para defender a PEC 001", recomendou, referindo-se à Proposta de Emenda Parlamentar, de 2015, aprovando percentuais mínimos que deverão ser repassados pela União, estados e municípios para a saúde. 

 

Cadê os conselhos?

Ilda Angélica Correia, presidente da Confederação Nacional dos Agentes Comunitários de Saúde (Conacs), questionou a ausência dos conselhos nacionais de Secretários de Saúde (Conass), de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) e de Saúde (CNS) na reunião. Os entes foram convidados a conversar com os parlamentares, ACS e ACE. "Eles são os principais responsáveis pela emissão dessas portarias e eles não estão aqui, por quê?", indagou. Vale citar que as portarias foram aprovadas pela Comissão Intergestores Tripartite (CIT), instância de articulação e pactuação integrado por gestores das três esferas de governo, incluindo Ministério da Saúde, Conass e Conasems. 

Dirigindo-se à convidada do Ministério da Saúde, Anne Elizabeth Antunes, diretora do Departamento de Atenção Básica (DAB), ela revelou que todos estavam vestindo blusas pretas, em referência ao luto que se colocam diante de uma medida que desconsidera a história dos ACS e ACE. "Estamos de luto. Somos mais de quatro mil profissionais ameaçados com essa portaria", destacou. Ela garantiu que a categoria não aceitará a portaria, bem como lutará pelo reajuste do piso salarial, puxando o grito "agentes unidos jamais serão vencidos". 

Diretor da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV), que no dia 20 de maio já havia manifestado repudio às portarias 958 e 959, entendendo resultar em equívoco e retrocesso, Paulo César Ribeiro lembrou que a escola acompanha e trabalha na formação dos ACS e, por isso, não poderia deixar de manifestar opinião contrária à proposta. Ele defendeu a revogação das portarias, por entender que as normas atacam a Política de Atenção Básica e o trabalho dos ACS, fundamentais no cuidado da saúde das comunidades. "Isso não significa o enfrentamento com os profissionais da enfermagem. Mas o papel dos ACS e ACE não podem ser substituídos pelos profissionais de enfermagem", frisou. 

Para Ribeiro, além de defender a manutenção dos agentes nas equipes de Saúde da Família, é preciso garantir a formação técnica desses profissionais "Um dos elementos que aparece como justificativa para se ter técnicos no lugar dos agentes é a necessidade de aumentar a resolutividade nas equipes de Saúde. Podemos fazer isso com a formação técnica completa dos ACS", orientou.

Os agentes comunitários de saúde e de endemias se reúnem hoje à tarde, ainda, como o ministro da saúde, Ricardo Barros, para exigir a revogação das portarias. 

 

Por Katia Machado, da Secretaria de Comunicação da RET-SUS

 

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