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03/12/2015 Versão para impressãoEnviar por email

Na 15ª CNS: a saúde pública sob a observação do controle social

Conferência Nacional de Saúde, em sua 15ª edição, inaugura debate sobre os rumos do SUS, sob aplausos e vaias.

A abertura da 15ª Conferência Nacional de Saúde, realizada no dia 1º de dezembro de 2015, no auditório principal do Centro de Convenções Ulysses Guimarães, em Brasília, após a Marcha em Defesa do SUS que conduziu milhares de pessoas em uma caminhada da Catedral de Brasília até o Congresso Nacional (sobre a Marcha ver abaixo), destacou-se pelos aplausos efusivos em um primeiro momento e por vaias em seguida. Aplaudida pela plateia, Maria do Socorro, presidente do Conselho Nacional de Saúde e coordenadora da conferência, iniciou justificando problemas na organização do evento, mas lembrando que a conferência que hoje reúne em torno de cinco mil pessoal, entre usuários, trabalhadores e gestores do SUS, chegou a mobilizar quase um milhão de pessoas em suas etapas distritais, municipais e estaduais. Ela destacou questões que precisam ser enfrentadas, focalizando o subfinanciamento do SUS, a relação público-privada e o consumo abusivo de agrotóxicos, e reconheceu a necessidade de algumas medidas de ajuste fiscal, ponderando, porém, que tais medidas não podem afetar direitos sociais. Nesse contexto, defendeu a taxação das grandes fortunas e das movimentações financeiras e aproveitou para cobrar que a presidente Dilma Rousseff cumpra com o compromisso que fez de lançar o Programa Nacional de Redução de Uso de Agrotóxicos (Pronara).

Socorro também fez críticas a propostas que estão em tramitação no Congresso Nacional, a exemplo da redução da maioridade penal, da terceirização dos serviços públicos, da flexibilização do Estatuto do Desarmamento, da retirada dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres e, principalmente, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 451, de autoria do deputado Eduardo Cunha, que obriga os empregadores brasileiros a garantirem a seus empregados planos de saúde, privilegiando o sistema privado de saúde em detrimento do público. “Nós vivemos em um país capitalista, mas temos que ter a capacidade de entender os processos históricos e se posicionar contra uma elite intolerante e forças conservadoras que tentam criminalizar nosso jeito de fazer política”, orientou, recebendo o apoio da plateia sob os gritos “fora Cunha”.  “Eu queria gritar o mesmo que vocês, mas a institucionalidade me impede”, explicou.

Defesa à CPMF

Quebrando o protocolo e tomando o lugar do mestre de cerimônia, Socorro conduziu o novo ministro da saúde, Marcelo Castro, ao púlpito, sem conseguir, porém, evitar as vaias do público. Castro iniciou a fala de forma amistosa, em uma tentativa de conquistar a plateia. No entanto, ao defender a CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira) como umas das novas fontes de arrecadação de recursos para saúde, recebeu uma das mais fortes reações negativas ao seu discurso. Outro momento embaraçoso referiu-se à demonstração de apoio à participação do setor privado na saúde. “É necessário que o setor privado participe de forma complementar”, afirmou Castro em alto tom, explicando que o setor privado estaria “subordinado” ao poder público, como nos casos das transferências de tecnologias.  

A mesa de abertura foi composta também por João Gabbardo dos Reis, presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Mauro Guimarães Junqueira, presidente do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), Rodrigo Rollemberg, governador do Distrito Federal, Wellington Dias, governador do Piauí, os ex-ministros da saúde, Agenor Álvares, Arthur Chioro e Alexandre Padilha, a presidenta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, Maria Emília Pacheco, o representante da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), Joaquim Molina, o presidente da Comissão de Seguridade e Família da Câmara de Deputados, Antonio Brito, além de autoridades internacionais de dozes países da América Latina.

Organizada em eixos

A 15ª CNS foi organizada em seis eixos temáticos: Direito à Saúde, garantia de acesso e atenção de qualidade; Participação e Controle Social; Valorização do trabalho e da educação em saúde; Financiamento do SUS e relacionamento público-privado; Gestão do SUS e os modelos de atenção à saúde; Informação, educação e política de comunicação do SUS e Reformas democráticas e populares do Estado. A partir das temáticas, os delegados dividiram-se em grupos de trabalho para discussão sobre as propostas provenientes das etapas anteriores à nacional.  Ao todo, são 28 grupos de trabalhos que analisam as propostas que tratam dos eixos temáticos. Segundo o regulamento, as propostas que obtiverem menos de 50% dos votos serão rejeitadas e as que tiverem 70% ou mais dos votos favoráveis, em pelo menos metade mais um dos GTs, estão aprovadas automaticamente. As demais irão para votação na plenária final, que acontece dia 4 de dezembro.

Público e estatal

A abertura da 15ª CNS foi precedida pela Marcha em Defesa do SUS, que reuniu cerca de 10 mil pessoas na tarde do dia 1º de dezembro. Os participantes, entre eles representantes do Conselho Nacional de Saúde, do Movimento Popular de Saúde (Mops), do Movimento Estudantil de Serviço Social e Dilemas Atuais (Andes), da Central Única dos Trabalhadores (CUT), da Associação Latino-Americana de Medicina Social (Alames) e da Frente Nacional contra a Privatização, saíram sob forte sol em caminhada da Catedral de Brasília em direção ao Congresso Nacional, onde formaram a cruz, símbolo do SUS. A defesa por um sistema de saúde público e estatal e a rejeição à privatização da saúde foram as principais bandeiras levantadas pelos manifestantes, que também mostraram apoio à luta contra o consumo abusivo de agrotóxicos e aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. “Saúde não é mercadoria” e ”não à entrada de capital estrangeiro” foram algumas das frases lidas e ouvidas durante toda a caminhada. 

O tema dos agrotóxicos, por sinal, foi focal para um grupo de mulheres militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) que, vestindo panos sobre a boca e coletes pretos, com caveiras brancas desenhadas, formaram um círculo no gramado em frente ao Congresso Nacional. Algumas embalavam nos braços bonecos que traziam a mesma caveira branca, fazendo alusão à posição da amamentação. Outras empunhavam cartazes que diziam “O leite materno está contaminado” e “Alto consumo de agrotóxico = má formação”. A encenação fez alusão aos inúmeros agravos à saúde da população provocado pelo uso massivo de agrotóxicos, entre eles a contaminação do leite materno de mulheres que foram expostas à pulverização aérea de agrotóxicos em plantações de soja em estados como o Mato Grosso

Representantes do Congresso Nacional, que fazem críticas a propostas que ferem os princípios do SUS, marcaram também presença, a exemplo dos deputados federais Odorico Monteiro de Andrade (PT-CE), Jorge Solla (PT-BA) e Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que falaria na mesa de abertura do dia seguinte da 15ª CNS. “O SUS é um conquista, um direito. Não podemos deixar passar medidas como a PEC 451, de autoria do deputado Eduardo Cunha”, criticou a líder da Bancada do PCdoB na Câmara dos Deputados, referindo-se à proposta em tramitação no Congresso Nacional que obriga os empregadores brasileiros a oferecer planos de saúde aos empregados, ferindo o princípio de universalidade do sistema de saúde garantido pela Constituição Federal. Ela destacou que é a única mulher no Congresso líder de bancada, reafirmando estar à disposição dos manifestantes na defesa do SUS. 

Por Ana Paula Evangelista e Katia Machado, da Secretaria de Comunicação da RET-SUS

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