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02/12/2016 Versão para impressãoEnviar por email

RET-SUS inicia sua segunda turma do Mestrado Profissional

Segundo turma do Mestrado Profissional da RET-SUS inicia com debate sobre a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 55, antiga 241, que propõe o congelamento dos gastos públicos nos próximos 20 anos. 

Despesa estatal e a PEC 55/241: o campo de batalha dos interesses de classe deu título à aula inaugural do Mestrado Profissional em Educação Profissional em Saúde da Rede de Escolas Técnicas dos SUS (RET-SUS), realizada no dia 28 de novembro, na Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), responsável pela coordenação da proposta. A nova turma é formada por trabalhadores de Escolas Técnicas do Sistema Único de Saúde (ETSUS) das regiões Norte e Centro-Oeste e de São Paulo. A aula foi apresentada por Carlos Otávio Ocké Reis, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e presidente da Associação Brasileira de Economia da Saúde (Abres), que lembrou a Constituição Federal de 1988, desenhada para colaborar com o combate à desigualdade social. “Depois da Ditadura Militar, quando o Brasil conseguiu taxas de crescimento elevadas, naquele modelo autoritário, ainda assim, persistia um alto grau de desigualdade na sociedade brasileira. Então, a Constituição foi desenhada para atacar a desigualdade, por meio do crescimento econômico e dos gastos e políticas sociais. A chamada Constituição cidadã tinha como pressuposto o alargamento dos direitos sociais na sociedade brasileira”, destacou, fazendo ressalva em seguida, em alusão à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 55, antiga 241, que propõe o congelamento dos gastos públicos nos próximos 20 anos: “Mas, a partir de 2018, infelizmente, se aprovada a PEC 55, impactando diretamente a Constituição de 1988 no que se refere à redução da desigualdade e ao direito de inclusão à saúde”.

Do ponto de vista da saúde, segundo o representante do Ipea, outro elemento fundamental da Constituição foi escrever que a saúde é um direito de todos. “Esse avanço não é uma questão menor. O modelo norte-americano — basicamente organizado pelo mercado — tinha, antes do Obama care, 50 milhões de pessoas fora do sistema, porque não tinham renda suficiente. O Brasil, um país de capitalismo periférico, ainda assim produz uma lei que garante saúde para todos, independentemente da condição de renda das pessoas. Essa ideia, extremamente avançada, está em jogo, hoje, com a PEC 55”, disse.

Outro aspecto importante da Constituição Federal apontado por Carlos Ocké foi a base de financiamento da seguridade social, definida em cima do lucro líquido das empresas e sobre a folha de salário, que era a base do financiamento do modelo do antigo Inamps [Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social]. Nos anos 1990, porém, com a ascensão de um governo de orientação social democrática e com uma política neoliberal, aconteceram dois fatos importantes: os 30% do orçamento da Seguridade Social que seriam canalizados para a Saúde nunca foram postos em prática; e, em 1993, com a crise da Previdência, a folha de salários — uma das fontes de financiamento que era fundamental para o SUS —ficou exclusivamente para a Previdência. “Boa parte dos problemas de gestão do SUS, hoje, decorrem de seus problemas de financiamento. A garantia de um sistema universal de saúde de qualidade precisa de financiamento. Se o sistema de saúde é subfinanciado, é claro que ele vai apresentar problemas. O problema do subfinanciamento é um problema estrutural do SUS”, destacou.

Dando um salto para o ano 2000, Carlos Ocké falou sobre os modelos de financiamento do sistema. Segundo ele, o Brasil aplica 4% do PIB [Produto Interno Bruto] em Saúde e 8% do PIB, considerando gastos público e privado. “Varia entre 55% do setor privado e 45% do setor público. Esse mix de gasto total de saúde pública e privada é característico de países que têm o poder privado, como é o caso do norte-americano. Então, na verdade, a nossa imagem-objetivo seria fortalecer o gasto público em detrimento do gasto privado, que estabelece uma relação parasitária com o SUS, que socializa os custos do funcionamento do setor privado”, observou.

Ele lembrou o ano de 2000, quando foi definido que o investimento do Governo Federal em saúde seria a despesa empenhada no ano anterior atualizada pela variação nominal do PIB. “Então, você teve um avanço, porque se tentou jogar o gasto público em saúde para frente, regulamentando o que não foi regulamentado na Constituição de 1988. Definiu-se melhor o esforço das ações de serviço público de saúde, mas, por outro lado, não foram estabelecidas prioridades”, avaliou.

Já, em 2014, começa a ser discutida a Proposta de Emenda Constitucional 29, que aumentaria a participação da União, saindo do modelo de variação nominal do PIB para 10% da receita corrente bruta. Essa proposta não foi aprovada e, em seu lugar, foi votada, em 2015, a Emenda Constitucional (EC) 86. “Em 2000, nós vinculamos o financiamento do SUS ao PIB. Em 2015, vinculamos à receita corrente líquida. E, com a PEC 55, quer se vincular, entre aspas, o financiamento do SUS à taxa de inflação oficial medida pelo IPCA. A PEC 55 dialoga com a EC 86, aprovada em 2015, e que mudou a base de cálculo do PIB para a receita corrente líquida”, criticou.

Segundo Carlos Ocké, o principal objetivo da PEC 55 é desvincular o orçamento da saúde e da educação do PIB. “A longo prazo, a população vai crescer. Então, há uma tendência de o gasto público per capita, portanto, diminuir em relação ao PIB. Teremos crescimento populacional e, consequentemente, envelhecimento populacional, aumentando a pressão sobre o serviço de saúde. Se já observamos, hoje, um quadro de subfinanciamento do SUS, imagine daqui a 20 anos. A PEC 55 tem como pressuposto o desmonte do SUS, a privatização do sistema e a piora das condições de saúde da população”, concluiu.
 

Em formação

A segunda turma do Mestrado Profissional em Educação Profissional em Saúde da RET-SUS é formada por 23 trabalhadores de Escolas Técnicas do SUS. O objetivo é formar trabalhadores docentes para o fortalecimento do sistema público de saúde. Assim como aconteceu com a primeira turma, formada por trabalhadores das ETSUS do Nordeste, o mestrado será realizado na modalidade concentração e dispersão, com aulas na sede da EPSJV, no Rio de Janeiro. Cada bloco de aulas terá 15 dias de duração, seguido de um período de dispersão, no qual os trabalhadores voltam para suas escolas e realizam os trabalhos propostos durante o período de concentração. A previsão é que o curso seja concluído em 2018, quando os estudantes apresentarão suas dissertações. As despesas com deslocamento e diárias dos alunos, durante o período do curso, serão custeadas com recursos da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde (Sgtes/MS).

 

Por Talita Rodrigues, da Comunicação da EPSJV/Fiocruz

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