A SGTES promoveu os encontros entre 19 e 21 de outubro nas cidades de Fortaleza e Curitiba
Por Joana Algebaile e Maíra Mathias
Nos dias 19, 20 e 21 de outubro foi a vez de as regiões Nordeste e Sul receberem a oficina ‘Diretrizes e Estratégias de Implementação de Cursos nas Escolas Técnicas do SUS/Profaps’ promovida pelo Departamento de Gestão da Educação na Saúde na Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde (Deges/SGTES/MS). O objetivo da segunda rodada de oficinas – que já havia passado por Campo Grande, Manaus e São Paulo entre 5 e 7 deste mês – foi discutir a operacionalização dos cursos técnicos em Citopatologia, Hemoterapia, Radiologia e Vigilância em Saúde. Para isso, dirigentes, coordenadores pedagógicos e docentes das Escolas Técnicas do Sistema Único de Saúde (ETSUS), representantes das Secretarias Estaduais de Saúde (SES) e dos Conselhos Estaduais de Educação (CEEs) se reuniram em Fortaleza e Curitiba.
As atividades propostas foram divididas em três momentos. No primeiro dia, durante a manhã, os técnicos do Deges realizaram uma apresentação sobre a estrutura do MS, as atribuições da SGTES e a missão da Rede de Escolas Técnicas do SUS (RET-SUS) para contextualizar os objetivos da oficina. A partir disso, os participantes expuseram suas expectativas sobre o trabalho a ser realizado. Ao final dessa apresentação inicial, foram montados dois grupos: um para discutir Vigilância em Saúde e Radiologia e outro para debater Hemoterapia e Citopatologia a partir de seus mapas de competências profissionais. Pontos como demanda, modalidades de oferta, perfil dos docentes, atividades pedagógicas e integração ensino-serviço serviram de guias para o trabalho. No último dia, o material consolidado foi apresentado para todos os participantes, que puderam fazer sugestões e alterações.
Demanda - No Sul, a questão da demanda pelos cursos de Hemoterapia, Citopatologia e Radiologia ocupou o centro do debate. Isso porque, todas as ETSUS da região pretendem oferecer o curso Técnico em Vigilância em Saúde, mas nenhuma previu os outros.
No caso da Citopatologia, há um complicador comum: são empresas particulares que prestam serviços ao SUS. “Na região Sul, esses serviços estão nas mãos de particulares, o que constitui um alerta”, opinou a técnica do Deges, Maria Aparecida Timo, complementando: “Por outro lado, há um amplo campo de estágio, já que o número de laboratórios e insumos é grande”.
Para Vânia Martins, diretora da Escola Técnica do SUS Dr. Manuel Aires (ETSUS Paraná), é contraditório formar trabalhadores para o setor privado. Já no Nordeste, o Centro Estadual de Educação Profissional em Saúde Monsenhor José Luiz Barbosa Cortez (ETSUS Piauí), relatou que no caso da Radiologia, a Escola optou por abrir vagas para servidores e para trabalhadores das redes conveniadas, em respeito à pactuação com os gestores municipais e com a esfera estadual. A ETSUS Piauí começou esse curso bem antes da publicação da Portaria nº 3.189 e já está na fase do estágio supervisionado.
No Sul também há relatos de serviços públicos que não identificam a demanda pelos cursos, como contou a coordenadora pedagógica da Escola de Formação em Saúde de Santa Catarina (EFOS), Rosana Luciano. “A ETSUS procurou o Laboratório Central do Estado [Lacen], que atende a oito macrorregiões, e nem assim houve demanda. No entanto, não tenho certeza se os gestores entendem o perfil do profissional”, considerou.
As técnicas do MS levantaram a possibilidade de a demanda existir, mas não ter sido identificada pelas ETSUS, uma vez que estes quatro cursos foram apontados como prioritários por Conass e Conasems.
No Nordeste, as Escolas identificaram convergências e divergências em relação a cada um dos cursos. Dentre as que se encaixam no primeiro grupo estão o resgate da cidadania dos profissionais através de sua qualificação; pactuar na CIB a programação de execução dos cursos; priorizar as necessidades regionais; e oferecer vagas, preferencialmente, para servidores públicos e trabalhadores inseridos no SUS.
Para as ETSUS, a Radiologia é uma formação necessária para o fortalecimento da rede hospitalar e do processo de regionalização do SUS. Já o curso de Hemoterapia iria ao encontro da expansão das hemorredes, vigente em muitos estados, como a Paraíba. “Os hemonúcleos foram ampliados e o pessoal não é suficiente. Hemocentros e bancos de sangue da rede privada não existem mais na Paraíba e a demanda aumentou muito”, explicou Emília da Costa, coordenadora pedagógica do Centro Formador de Recursos Humanos (ETSUS Paraíba), completando: “A coordenadora do Hemocentro já estava discutindo com a Escola a necessidade do curso, mas não havia recursos, então o Profaps foi um alívio nesse sentido”. A Escola pretende abrir uma turma-piloto em João Pessoa.
Já no Ceará, de acordo com a coordenadora da Educação Profissional da Escola de Saúde Pública do Ceará (ESP-CE), Maria Ivanilia Timbó, o curso de Hemoterapia é uma necessidade, mas não foi priorizado: “A gente priorizou trabalhar o Técnico em Análises Clínicas, pela própria organização do serviço, que é uma rede de policlínicas. Mas é um projeto que a gente tem intenção de trabalhar no próximo ano, pois temos três hemocentros nas três macrorregiões”, prevê ela. Parecida é a realidade da Bahia, que vive uma expansão da rede Lacen nas microrregionais e também optou por investir em Análises Clínicas. “São 26 unidades, cada uma com cinco técnicos que precisam ser qualificados. Tudo tem que ser pactuado de acordo com as demandas locorregionais”, ensina Geisa Plácido, coordenadora pedagógica da ETSUS.
Para a técnica do Deges, Mônica Durães, ainda há fragilidades na identificação das demandas, passo fundamental para a elaboração de cursos que formarão profissionais para a média e alta complexidade. “A ETSUS desenvolve dois trabalhos importantes: um na gestão da educação e outro na gestão da saúde. Como a Escola está fazendo essa articulação com a gestão da saúde? Em alguns estados, ainda não é uma discussão organizada e articulada com a organização dos serviços e esses cursos não são de formação ‘em massa’, como o ACS e como temos perspectiva de fazer com a Vigilância”, avaliou.
Oferta e docentes - Foi consenso no Sul que a primeira turma de cada curso seja oferecida de forma experimental nas sedes das escolas para que somente depois haja descentralização. No Nordeste, a tendência é centralizar todos os cursos, menos Vigilância em Saúde. Somente a Paraíba vai ofertar Radiologia com uma turma descentralizada. Quanto à metodologia, as duas regiões concordaram que os cursos devem ser presenciais em período contínuo e com alternância.
“Nós vamos oferecer Radiologia em Fortaleza, porque, nesse momento, nós identificamos que a capital dispõe de uma rede de serviços que dá suporte para o campo de estágio e para a vivência. Porque as Escolas não têm condições de montar um laboratório com equipamentos como ressonância magnética. Temos que utilizar as universidades, a rede”, afirmou Maria Ivanilia.
Para Vânia Martins, a necessidade de prática e estágio em grandes laboratórios obriga que o cronograma do curso de Citopatologia seja flexível, já que só será oferecido em cidades de grande porte e o público poderá vir de todo o estado. “Seria interessante oferecer uma bolsa para que os alunos de fora possam se manter. O gestor não tem como arcar com esse custo. Um grande incentivo seria o MS se responsabilizar”, sugeriu a diretora da ETSUS Paraná.
Quanto ao perfil do docente, a região Norte concluiu que na Vigilância em Saúde, haverá uma predominância de enfermeiros e outros profissionais de nível superior que já atuam na área com ou sem licenciatura. Já em Radiologia, há maiores possibilidades de encontrar tecnólogos dispostos a dar aulas e, no Ceará, a universidade federal (UFCE) colocou à disposição da ESP-CE alguns físicos. Estabelecer parcerias com instituições de ensino superior também foi sugestão para Citopatologia e Hemoterapia, cursos que demandam de docentes que atuem, preferecialmente, nos laboratórios especializados. Uma das dificuldades levantadas foi a resistência dos profissionais em virtude do baixo valor hora-aula ou o fato de que muitos deles têm mais de um vínculo de trabalho.
A coordenadora de cursos descentralizados da Escola Técnica de Saúde de Blumenau, Nanci Aparecida da Silva, considera que haverá dificuldades em se achar docentes para a Vigilância em Saúde que tenham uma visão mais ampla, sem ficar restrito às áreas ambiental, epidemiológica, sanitária e saúde do trabalhador. “E não podemos ter só um profissional com a experiência do serviço, mas que tenha também a questão pedagógica. E isso é um grande problema”, assegurou.
Dispersão, concentração, estágio, prática e teoria - Estágio e dispersão significam a mesma coisa? Dispersão tem relação com a prática e concentração com a teoria? Foi em torno dessas duas perguntas que surgiu a grande polêmica do encontro das ETSUS do Nordeste. “Eu acho que é uma questão conceitual. Dispersão é uma coisa e estágio supervisionado é outra. A dispersão tem alguns momentos supervisonados, mas eu não considero isso como estágio”, afirmou Geisa Plácido.
Para a consultora do Deges, Maria Auxiliadora Christófaro, dispersão é uma dessas palavras que acabaram virando jargão.“O Em Larga Escala nos deixou esse jargão da dispersão e o Profae também nos deixou o do currículo integrado. Estamos trabalhando com jargões, quando, em planos curriculares, temos que trabalhar com conceitos. As palavras dispersão e concentração não estão significando aula teórica e aula prática”, defendeu.
Ao final do encontro, antes do balanço final das atividades, Maria Auxiliadora foi convidada pelas ETSUS a explicar melhor o que queria dizer (veja o PPT da apresentação aqui). Ela lembrou que a ‘dispersão’ foi uma estratégica do ‘Larga Escala’ e que é preciso avaliar, primeiro, se hoje ela ainda tem pertinência e, segundo, tomar cuidado para adaptar à realidade atual.
Auxiliadora divide as atividades pedagógicas em teóricas e práticas. Para ela, é preciso ter em vista que a prática é a materialização crítica e operacional da teoria. “Nós não podemos nos basear apenas no que Darwin escreveu sobre genética se quisermos prestar assistência na área de Saúde da Mulher; assim como não basta só saber o que é mitose e meiose para qualificar o indivíduo a fazer um parto. Não basta ter mão e coragem para cortar para se fazer uma cirurgia”, exemplificou, completando: “Por isso que não podemos falar que a técnica é uma coisa e a teoria é outra”.
Para ela, existem dois tipos de atividade prática: a simulada ou experimental e a da situação real de trabalho. “Na prática experimental, você ensaia uma atividade que um dia vai fazer na situação real de trabalho. Para os cursos de Citopatologia e Hemoterapia vai ser muito necessário. É o caso de simular a leitura de uma lâmina, fazer uma, duas, três vezes, até acertar”. Já a situação real de trabalho se distingue porque o erro não pode ser essencial. “Esses estágios podem ter acompanhamento direto e contínuo, como é o caso das residências médicas. Ninguém coloca um aluno do primeiro ano de residência para fazer uma cirurgia sem o cirurgião do lado”.
Ainda de acordo com a consultora do Deges, concentração e dispersão não são sinônimos de teoria e prática. “Eu posso fazer aulas teórica, por meio de seminário, mesa redonda, estudo dirigido, vídeo-conferência. As pessoas não necessariamente precisam estar presentes no mesmo local. Um bom exemplo é a orientação, atividade marcadamente teórica que pode ser desenvolvida com o orientador em um país e o orientando em outro, caso das bolsas ‘sanduíche’, comuns no doutorado”.
Maria Auxiliadora divide em quatro os modos da escola trabalhar com a prática e a teoria: aula, orientação, pesquisa e desenvolvimento de projetos. Partindo desses modos, podem se eleger duas formas: em concentração ou em dispersão. “Tipo, modo, forma, o que vai mudar? Concepções de educação. Se eu acredito na escola para formar sujeitos ou para formar soldados”, definiu.
Os Conselhos - “As ETSUS não trabalham simplesmente com aperfeiçoamento e qualificação, elas trabalham com formação”. A frase é da conselheira de Sergipe, Anna Lúcia Souza, e ilustra bem a aproximação da RET-SUS com os CEE. A exemplo do que aconteceu nas regiões Centro-Oeste e Norte, o fato também foi destacado pelos dirigentes do Nordeste.
Anna Lúcia, que também é membro do grupo de trabalho montado pelo Ministério da Educação (MEC) para discutir as diretrizes para a Educação Profissional Técnica de Nível Médio, tranquilizou as Escolas quanto à questão da obrigatoriedade da licenciatura para os docentes, que está posta na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB).
É que na minuta da proposta de resolução, dentro do artigo que decide que a formação inicial para o magistério na Educação Profissional Técnica de Nível Médio vai se realizar por meio de cursos de licenciatura foi incluído um parágrafo que abre uma brecha para que as ETSUS, Institutos Federais e outras instituições possam se adaptar. “Os sistemas de ensino regulamentarão o processo de transição para viabilizar a formação em licenciatura dos profissionais que atuam na Educação Profissional Técnica de Nível Médio”, diz o texto. A conselheira de Sergipe explicou que o Conselho Nacional de Educação e o MEC não abrem mão da licenciatura, mas que também entendem que precisa haver mais tempo para que os profissionais dos serviços que atuam como docentes façam os cursos. “Não é um problema que atinja só as ETSUS. A maior parte das instituições formadoras de profissionais de nível médio não dispõe de profissionais licenciados em todas as áreas. Um exemplo é o curso técnico de Petróleo e Gás. Será que os engenheiros que atuam como docentes têm licenciatura? É provável que não”, avaliou.
Na região Sul, somente o CEE do Rio Grande do Sul foi representado. O fato foi lamentado, uma vez que as escolas da região têm dificuldades de aceitação dos cursos descentralizados no conselho. “ETSUS têm peculiaridades em relação às outras escolas e isso tem que ser levado em conta”, afirmou a coordenadora pedagógica da ETSUS Rio Grande do Sul Rosemari Dorigon.
O conselheiro do CEE-RS Richer Kniest afirmou que no estado, as escolas técnicas públicas levam um ano e meio para aprovar cursos, enquanto que as particulares levam de quatro a seis meses. “O problema é que os processos das escolas públicas chegam ao conselho muito ruins”, opinou. No entanto, ele confessou que não tinha conhecimento da dinâmica das ETSUS e da relação entre os entes estadual e federal. “Agora minha visão mudou e sei que precisamos alinhar as coisas. Hoje sei o que são as Escolas, o Profaps, a educação profissional. A conversa está viabilizada”, considerou Richer.
Na Bahia e em Pernambuco, a autorização dos cursos das ETSUS não passa pelos Conselhos e, sim, pelas secretarias estaduais de educação (SEE). “Lá na Bahia a Escola de Formação Técnica [em Saúde Prof. Jorge Novis] não passa pelo conselho porque a SEE entende que, por ser uma escola de governo, não precisa”, disse a coordenadora pedagógica da ETSUS.
Terceira rodada - A terceira - e última - rodada de oficinas do Profaps acontecerá ao longo do mês de novembro em três ocasiões diferentes. As primeiras regiões a receberem o evento são Norte e Sudeste. Belém, capital do Pará, e Rio de Janeiro sediarão o encontro, que acontece entre os dias 10 e 12. Cuiabá, capital do Mato Grosso, vai abrigar as Escolas do Centro-Oeste nos dias 17, 18 e 19 e, em seguida, é a vez de Florianópolis, em Santa Catarina, e Natal, no Rio Grande do Norte, receberem o evento.
Apresentações
Nordeste:
Grupo 1 - Hemoterapia e Citologia
Grupo 2 - Vigilância em Saúde e Radiologia
Sul:
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