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22/05/2015 Versão para impressãoEnviar por email

Dilemas da participação social em ano de conferência de saúde

Conferência Distrital de Saúde, no Rio de Janeiro, faz defesa por um SUS público, universal, de qualidade e sob a gestão pública e direta do Estado, além de um modelo de cuidado de base territorial, com porta de entrada prioritária na Atenção Primária.  

Pedra de toque, como assim definem Inesita Araújo e Janine Cardoso, pesquisadoras do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Icict/Fiocruz), no livro Comunicação e Saúde, onde fazem um paralelo entre os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) e o campo da comunicação, a participação social é bastante cara àqueles que defendem a Saúde Pública. No ano da 15ª Conferência Nacional de Saúde (CNS), a realizar-se de 1º a 4 de dezembro, em Brasília, a participação torna-se essencial, ampliando as vozes mais periféricas para além dos conselhos de saúde. A mobilização da sociedade em torno do tema central da 15ª CNS — Saúde pública de qualidade para cuidar bem das pessoas: direito do povo brasileiro — inicia com as etapas distritais, municipais e estaduais desse grande encontro, por serem fundamentais para o amadurecimento das propostas que visam o fortalecimento do SUS.

No Rio de Janeiro, a mobilização social destaca-se com a 12ª Conferência Distrital de Saúde da AP 3.1, que aconteceu entre os dias 7 e 9 de maio. Esta etapa reuniu diversos segmentos da sociedade civil organizada e autoridades públicas para avaliar a situação da saúde, formular diretrizes e definir propostas, visando alcançar a otimização do acesso com qualidade para a região que envolve os bairros de Bonsucesso, Brás de Pina, Complexo do Alemão, Cordovil, Ilha do Governador, Jardim América, Manguinhos, Maré, Olaria, Parada de Lucas, Penha Circular, Penha, Ramos e Vigário Geral.

Localizada no território de Manguinhos, a sede da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) teve participação ativa neste processo. Somente a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV), unidade da Fiocruz, contou com dez representantes no evento, como convidados, integrando um grupo de 28 trabalhadores, estudantes e moradores da região. Após muitos debates, o grupo construiu um documento (veja aqui), trazendo propostas que recuperam o ideário da 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986) e que culmina no direito a todos à saúde garantido pela Constituição Federal de 1988.

 

Determinação social

O documento traz orientações para atuar nas condições e determinações sociais, econômicas e políticas que afetam a saúde e a qualidade de vida das populações e defende um SUS público, universal, de qualidade e sob a gestão pública e direta do Estado, no regime de direito público, e um modelo de cuidado de base territorial, com porta de entrada prioritária na Atenção Primária, com desenvolvimento pelas linhas de cuidado por meio de rede que integrem as ações de saúde nos territórios com as ações das esferas municipais, estaduais e federais do SUS. 

Outro ponto relevante para o grupo é a chamada desburocratização das conferências e dos conselhos. Um dos representantes da EPSJV na Conferência Distrital, o psicólogo Geandro Ferreira Pinheiro observa que os espaços de participação social estão ainda muito limitados, pois só permitem a participação de grupos com CNPJ. “Apesar da orientação de se ter novos formatos de participação, os municípios e os estados se apropriam disso da maneira que querem. Se a Conferência Estadual do Rio de Janeiro fosse acontecer hoje, seria completamente fechada e vedada a outros grupos”, criticou.

O grupo de Manguinhos defende que instituições que interferem na saúde, como escolas técnicas ou escolas de saúde pública, a exemplo da EPSJV, sejam consideradas “unidades de saúde” para efeitos de participação nos conselhos e conferências — apenas as unidades assistenciais podem ter representatividade nessas instâncias. “A EPSJV e a Fiocruz foram extremamente importantes na Reforma Sanitária, na 8ª CNS e na criação do SUS, mas esse entusiasmo foi sendo perdido, saiu do campo popular e se aproximou do campo da institucionalidade”, observa Geandro. Ele revela que, para não deixar morrer esse movimento de inserção na 15ª CNS, o grupo do qual a Fiocruz participa já começou a se organizar para as próximas etapas. “Vamos continuar essa articulação na Fiocruz e na própria escola [EPSJV], buscando ampliar essa discussão. Estamos nos programando para realizar uma conferência local e incorporar propostas para levar para municipal e mostrar o que está em jogo hoje”, disse.

Geandro chama atenção, ainda, para a necessidade de um olhar específico para o que determina os problemas da região. “Os problemas não são somente na saúde, mas também na forma de entender o estado e a proteção social. Os principais problemas de modelo de cuidado estão vinculados à contratação e à fixação de profissional. Precisamos valorizar o trabalhador, ter um plano de carreira”, defendeu.

 

Prioridades

Em suma, o documento combate os modelos privatizantes de gestão na saúde, tais como as Organizações Sociais (OS), as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), as Fundações Estatais de Direito Privado, as fundações de apoio das universidades e entidades de Ciência e Tecnologia e a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), entre outros, e defende a implantação da Reforma Psiquiátrica, com ampliação e fortalecimento da rede de atenção psicossocial, a ampliação do controle social, com autonomia e independência perante a gestão, e a implantação das deliberações dos conselhos de Saúde municipais, estaduais e nacional.

O grupo — expressão da maioria dos participantes da Conferência Distrital — critica a avaliação feita pelo secretário de saúde do município do Rio de Janeiro, Daniel Soranz, que atribui o avanço da Atenção Básica à atuação das OSs no município. Ele participou da mesa de abertura da 12ª Conferência Distrital de Saúde da AP 3.1, trazendo alguns dados sobre o avanço da cobertura da Atenção Básica na cidade e a meta de alcançar em 70% de cobertura da Saúde da Família como legado das Olimpíadas Rio 2016.   

 

Por Ana Paula Evangelista, repórter da Secretaria de Comunicação da RET-SUS

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